Não faz sentido comparar as eficácias globais de vacinas diferentes contra a Covid-19

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Os números são os mais variados: 95%, 50,38%, 66%, 91,6%, 73%. Toda semana, novos dados sobre a eficácia dos imunizantes contra a Covid-19 são divulgados e, claro, há muita especulação sobre o significado desses índices.

Isso tem feito muitos acharem que uma vacina é melhor do que a outra, mesmo sem saber detalhes sobre as tecnologias usadas em cada uma delas ou sobre o que a eficácia de fato significa. A situação não é exclusiva do Brasil nem de pessoas comuns. Na semana passada, o prefeito de Detroit, nos EUA, disse que não quer as vacinas da Janssen, porque as da Pfizer e da Moderna são melhores.

Os cientistas alertam que essa abordagem é equivocada. Julgar um imunizante com base apenas na eficácia global reportada é um erro. E isso especialmente quando a pandemia continua altamente disseminada em todo o mundo. Pense, então, no Brasil, que não tem controle da doença nem vacinas suficientes para toda a população.

É preciso lembrar que essas fórmulas passam por várias etapas de testes antes de serem liberadas para uso. Elas são examinadas em relação a segurança, capacidade de produzir anticorpos e eficácia. Essas análises são individuais e não têm o objetivo de contrapor substâncias diferentes.

Por isso, comparações diretas podem não fazer sentido, já que os resultados são obtidos de formas diferentes. E isso piora quando uma vacina anuncia uma eficácia alta: passa-se a esperar que outros imunizantes apresentem resultados superiores. “Se não houvesse uma fórmula com 95% de eficácia, todos achariam esse resultado [de 66% da Janssen] espetacular”, diz Anthony Fauci, diretor do Instituto Nacional de Alergia e Doenças Infecciosas dos EUA.

Condições de teste

Os testes no mundo real, realizados na fase 3 do estudo das vacinas, envolvem milhares de participantes e todos os fatores existentes em ambientes não controlados. As taxas de infecção a que os indivíduos são expostos, por exemplo, dependem de onde eles estão.

Eles podem ter acesso fácil ao sistema de saúde, por exemplo. Ou estar sob um lockdown rígido. Além disso, o tempo que se leva para recrutar os participantes dos estudos e finalizar as análises faz diferença em como a disseminação da doença evolui nesse período.

Outro aspecto é o público. No caso da CoronaVac, por exemplo, os testes de fase 3 conduzidos no Brasil tiveram apenas profissionais de saúde como voluntários. Esses participantes estão, naturalmente, mais expostos à doença no dia a dia do que cidadãos que atuam em outras áreas.

Então, uma eficácia mais baixa pode estar relacionada a esse aspecto – em outros países, como a Turquia, a eficácia global encontrada foi de 83,5% enquanto aqui no Brasil atingiu apenas 50,38%.

Outra vacina com dados discrepantes é a da Janssen. A pesquisa obteve eficácia de 72% na prevenção de sintomas da Covid-19 nos EUA enquanto, na África do Sul, que teve uma variante agressiva que conseguiu escapar dos imunizantes, a eficácia foi de 64%. Já a prevenção de desenvolvimento de casos graves foi de 85,9% nos EUA e de 81,7% na África do Sul.

Amesh Adalja, do Centro de Segurança de Saúde do Johns Hopkins, diz que, por isso, não é possível comparar esses números. “Não se pode comparar resultados de testes a não ser que tenham sido feitos em condições absolutamente iguais.”

Além disso, segundo ele, o objetivo da vacina contra a Covid-19 era transformar o novo coronavírus em um microrganismo inofensivo. “A ideia é que ele se tornasse apenas mais um vírus respiratório. Todas as vacinas disponíveis nos EUA [PfizerModerna e Janssen] são extremamente eficientes nisso.”

Nos EUA, a Covid-19 já matou mais de 500 mil cidadãos. Aqui no Brasil, foram mais de 265 mil vítimas. Enquanto isso, variantes continuam a surgir e não vão parar de aparecer enquanto a disseminação do novo coronavírus não for controlada – ou seja, isso pode prolongar ainda mais a duração da pandemia.

A melhor vacina é a disponível

Todas as fórmulas já em uso em diferentes partes do mundo são altamente eficazes na prevenção de internações e mortes por Covid-19, bem como reduzem em 100% o índice de mortes. Então, optar por não comprá-las ou não recebe-las dificulta a campanha global que tenta controlar o espalhamento da doença. Só com as vacinas é possível transformar a crise global de saúde pública em uma doença infecciosa comum.

Lawrence Corey, que estuda virologia no Fred Hutchinson Cancer Research Center, em Seattle, nos EUA, lembra que a pandemia ainda está agindo. “Eu não escolheria [a marca] se fosse do grupo de risco. Isso pode deixar o indivíduo sem a proteção que é garantida pela vacina”, alerta.

Além disso, é preciso lembrar de quem tem alergias ou outras condições que impedem que sejam vacinados. Isso torna ainda mais importante que todos os demais recebam as doses de vacina para que seja possível obter a imunidade de rebanho.

Enquanto não se sabe como as vacinas vão se comportar em relação às variantes, os pesquisadores já investigam a opção de oferecer doses de reforço ou de modificar as fórmulas atuais para que possam conter novas cepas. Além disso, os pesquisadores dos diferentes imunizantes vão ter de começar a compartilhar dados para obter conclusões mais adequadas ao atual momento da pandemia.

Para Natalie Dean, professora-assistente de bioestatística da Universidade da Flórida, é preciso considerar como os dados podem ser comparados e combinados. “Sem isso, as respostas vão ser confusas”, aponta.

A conclusão, então, é que a comparação das eficácias das vacinas é injusta. Os índices obtidos para cada substância são específicos para as condições em que elas foram avaliadas.

E mais: para os especialistas, o mais importante é quanto as vacinas previnem internações e mortes. Pelos resultados obtidos até agora em localidades que já avançaram bastante na vacinação, todas elas têm sido excelentes para manter as pessoas vivas. Por isso, o consenso é de que a melhor vacina é a que está disponível. “É assim que vejo esses imunizantes, como intercambiáveis”, avalia Adalja.

É importante lembrar, ainda, que as vacinas são apenas parte do conjunto de medidas de saúde pública necessários para controlar a disseminação da Covid-19. Distanciamento social, uso de máscaras, lavagem das mãos, testes diagnósticos, rastreamento e isolamento dos doentes são igualmente cruciais.

Fonte: Vox

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Fonte olhardigital
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