STF retoma julgamento sobre saída do Brasil de convenção da OIT que trata de demissão sem justificativa

Caso pode ter repercussões nas regras sobre demissão sem justa causa na iniciativa privada. Processo sobre o tema tramita há quase 26 anos.

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O Supremo Tribunal Federal (STF) retomou nesta sexta-feira (19) o julgamento de uma ação que discute a validade de um decreto presidencial que liberou o Brasil, sem o aval do Congresso, da aplicação de uma convenção da Organização Internacional do Trabalho (OIT).

Uma decisão da Corte sobre este caso – que tramita no tribunal há quase 26 anos – pode ter repercussões nas regras de demissão sem justa causa na iniciativa privada.

Pela Convenção 158 da Organização Internacional do Trabalho, o empregador fica obrigado a justificar a razão pela qual está demitindo o trabalhador. Diz um trecho da norma:

“Não se dará término à relação de trabalho de um trabalhador a menos que exista para isso uma causa justificada relacionada com sua capacidade ou seu comportamento ou baseada nas necessidades de funcionamento da empresa, estabelecimento ou serviço.”

A norma prevê ainda uma série de situações que não podem ser usadas como justificativa para o encerramento da relação de emprego. Entre elas:

  • a filiação a um sindicato;
  • a candidatura para o cargo de representante dos trabalhadores;
  • o fato de apresentar uma queixa ou participar de um procedimento estabelecido contra um empregador por supostas violações de leis ou regulamentos, ou recorrer perante as autoridades administrativas competentes;
  • a raça, a cor, o sexo, o estado civil, as responsabilidades familiares, a gravidez, a religião, as opiniões políticas, a ascendência nacional ou a origem social;
  • a ausência do trabalho durante a licença-maternidade;
  • a ausência temporal do trabalho por motivo de doença ou lesão.

 

Além disso, os empregadores não poderão demitir empregados sem que se dê a eles a possibilidade de se defender de acusações, quando o término da relação de trabalho for por motivos relacionados com seu comportamento ou seu desempenho.

A regra estabelece ainda a possibilidade de, diante de dispensas consideradas arbitrárias, os trabalhadores acionarem o sistema judicial do país para decidir a questão e cobrar indenização.

A Convenção é de 1982, mas foi incorporada à legislação brasileira por um decreto legislativo de setembro de 1992 e um decreto presidencial de abril de 1996.

Meses depois, em dezembro de 1996, o então presidente Fernando Henrique Cardoso assinou novo decreto, desta vez definindo que não seria necessário aplicar a Convenção – fez a chamada “denúncia”, ou seja, uma saída unilateral do acordo.

Em fevereiro de 1997, a Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura (Contag) acionou o Supremo contra o decreto presidencial que formalizou a saída do Brasil da Convenção.

Para a Contag, o presidente não poderia tomar a decisão de deixar de cumprir o tratado sem que houvesse um aval do Congresso Nacional. Isso porque, pela Constituição, o processo de incorporação de uma convenção às leis do país é um rito com a participação tanto do Poder Executivo quanto do Poder Legislativo.

Este processo de incorporação é o que viabiliza que tratados internacionais passem a ter vigor, ou seja, passem a ser obrigatórios no país.

Confira a cronologia da ação no STF:

  • A ação começou a ser julgada em 2003, com o voto do relator, à época o ministro Maurício Corrêa. O ministro Nelson Jobim pediu vista nesta primeira oportunidade.
  • Em 2006, o julgamento foi retomado e interrompido por um novo pedido de vista, desta vez do então ministro Joaquim Barbosa.
  • Em 2009, na terceira análise, foi a vez de a ministra Ellen Gracie suspender a análise por outro pedido de vista.
  • Em 2015, nova suspensão a partir do pedido do então ministro Teori Zavascki.
  • Em 2016, mais uma vez o julgamento foi adiado, desta vez pelo ministro Dias Toffoli.
  • Em 2022, o caso volta à análise em outubro, mas acaba interrompido pelo pedido de vista do ministro Gilmar Mendes.

Posicionamento dos ministros

 

O relator do caso, o então ministro Maurício Corrêa, votou no sentido de que o decreto que retirou o Brasil da Convenção deve passar pelo aval do Congresso para produzir efeitos. Acompanhou esta posição o ministro Carlos Ayres Britto, no começo do julgamento.

Os então ministros Joaquim Barbosa e Ricardo Lewandowski, além da ministra Rosa Weber, concluem que o decreto que retirou o Brasil da Convenção é inconstitucional. Entendem que as normas que incorporaram o tratado às leis brasileiras continuam em vigor e que, se o presidente da República quiser deixar de aplicá-la no Brasil, precisa da anuência do Congresso Nacional.

O então ministro Teori Zavascki considerou que a saída unilateral de tratados internacionais demanda um aval do Congresso para que suas regras não tenham mais efeitos no país.

Para garantir a segurança jurídica, Zavascki votou no sentido de que a decisão teria efeito para o futuro, mantendo a eficácia das retiradas unilaterais realizadas antes disso – inclusive da Convenção da OIT. O ministro Dias Toffoli seguiu a mesma linha.

O então ministro Nelson Jobim votou no sentido de rejeitar a ação, porque considerou que é constitucional a denúncia unilateral, mesmo sem o aval do Congresso.

O julgamento ocorrerá no plenário virtual, formato de deliberação em que os ministros apresentam seus votos em uma página da Corte na internet, sem a necessidade de sessão presencial ou por videoconferência. A deliberação está prevista para se encerrar às 23h59 do dia 26 de maio – se não houver novo pedido de vista ou de destaque.

Na retomada do julgamento, nas primeiras horas desta sexta, o ministro Gilmar Mendes votou na linha das posições dos ministros Dias Toffoli e Teori Zavascki – de que a retirada do Brasil de tratados depende do aval do Congresso.

Para Gilmar, pela segurança jurídica, este entendimento vai valer para o futuro, preservando as denúncias unilaterais realizadas até então – inclusive a realizada sobre a convenção da OIT. Faltam os votos dos ministros Nunes Marques e André Mendonça.

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Fonte globo
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