Saída de Moro foi por derrotas como ministro, diz Carla Zambelli
Deputada federal era próxima de Moro e seria uma das testemunhas das intenções de Bolsonaro em interferir na Polícia Federal
A deputada federal Carla Zambelli afirmou em depoimento à Polícia Federal nesta quarta-feira (13) que chegou a propor para Sérgio Moro uma lista tríplice para que Bolsonaro escolhesse a direção-geral da Polícia Federal.
Zambeli também esclareceu o teor de algumas trocas de mensagens com Moro, que cedeu o histórico de conversas para a Polícia Federal e afirmou que tentou conversar com o ex-ministro para evitar sua saída do Ministério da Justiça e Segurança Pública. Segundo ela, o ex-juiz estaria decepcionado “com diversas derrotas” na função e não com a troca no comando da PF.
Ela relatou ainda que chegou a conversar com outros dois ministros de Bolsonaro, que pediram que “ela fizesse o possível” para que Moro continuasse no cargo de ministro da Justiça. E assim foi até minutos antes de ele fazer a coletiva em que anunciou sua demissão.
Sobre as mensagens em que cita “uma vaga no Supremo”, a deputada destaca que o texto foi no intuito de demonstrar que poderia trabalhar junto a Jair Bolsonaro para que Moro pudesse ser indicado. Zambelli destacou que já teria feito articulação semelhante em favor de Ives Gandra na gestão do ex-presidente Michel Temer. Entretanto, frisou que nunca chegou a conversar com Bolsonaro sobre o tema em relação a Moro.
Zambelli é próxima do ex-ministro, que foi seu padrinho de casamento, e chegou a ter mensagens sobre a troca na Polícia Federal divulgadas por Moro no dia em que pediu demissão do Ministerio da Justiça e Segurança Pública.
Carla também explicou que, pela proximidade com o ex-juiz e com o presidente Jair Bolsonaro, tentava emplacar o padrinho de casamento como uma indicação para o STF (Supremo Tribunal Federal).
O depoimento de Carla Zambelli aconteceu na sede da Polícia Federal, em Brasília. A oitiva foi acompanhada por representantes da PGR (Procuradoria Geral da República), da AGU (Advocacia Geral da União) e de um dos advogados que representa Sérgio Moro no processo.
Em outra sala da PF, no mesmo horário, prestou depoimento Carlos Henrique Oliveira de Sousa, atual diretor-executivo da corporação e que era o superintendente da PF no Rio de Janeiro que Bolsonaro queria substituir. Houve ainda o depoimento de Alexandre da Silva Saraiva, superintendente da PF no Amazonas, que chegou a ser um nome cogitado por Bolsonaro em uma de suas primeiras tentativas de trocar o comando da organização no Rio.
Já prestaram esclarecimentos no caso, além de Moro, o ex-diretor-geral da PF Maurício Valeixo; Alexandre Ramagem, um dos indicados para substituir Valeixo por Bolsonaro; Ricardo Saad, outro ex-superintendente da PF no Rio de Janeiro, e os ministros Luiz Eduardo Ramos, da Secretaria de Governo, Augusto Heleno, do Gabinete de Segurança Institucional e Walter Braga Netto, da Casa Civil.
Ontem, Moro e representantes da AGU, da PGR e do STF assistiram ao vídeo da reunião ministerial de 22 de abril, apontada pelo ex-ministro em seu depoimento como prova das intenções de Bolsonaro de interferir na Polícia Federal.
Confira a íntegra do depoimento de Carla Zambelli:
Inquirida a respeito dos fatos, respondeu que: é Deputada Federal pelo Estado de São Paulo, eleita no ano de 2018, assumindo em 2019 seu primeiro mandato parlamentar;
Sobre o interesse de o secretário Nabhan Garcia falar com o ex-ministro SERGIO MORO Moro, conforme mensagem pela depoente enviada a este no dia 06/04/2020, afirma que o assunto não tem qualquer referência com os fatos investigados nesse inquérito
Questionada sobre a mensagem enviada ao ex-ministro SERGIO MORO, esclareceu ter dito que, em sua perspectiva, como ativista, houve certas observações sobre a Lava Jato a época em que o delegado MAURICIO VALEIXO era diretor de Combate ao Crime Organizado, no sentido de não haver o suporte operacional ideal da Polícia Federal em Brasília junto aos delegados da Lava Jato Paraná; Disse que isso não significa ter algo desabonador em relação à gestão do delegado MAURICIO VALEIXO quando à frente da Diretoria. Que ainda com relação a essa mensagem, mais precisamente sobre a razão de enviá-la, respondeu que já havia notícias de uma possível troca na Polícia Federal. Que tais notícias vieram de diversas fontes tais como, a própria imprensa e amigos da depoente na corporação, no sentido de o delegado MAURICIO VALEIXO já ter externado desde janeiro de 2020 que já havia cumprido sua missão na Diretoria da Polícia Federal, demonstrando cansaço no exercício dessa função; Que foi então que indicou como alternativa ao ex-ministro SERGIO MORO Moro a observância de uma lista tríplice que havia sido divulgada pela imprensa, ainda à época do Governo TEMER; Que acaso fosse observada a votação da lista tríplice, a Delegada da Polícia Federal Érika poderia impulsionar a Lava Jato junto ao Supremo Tribunal Federal, em casos relacionados a parlamentares, diante do seu histórico profissional;
Que a resposta dada pelo ex-ministro SERIO MORO em 17/04/2020, às 14:41h, foi reafirmando a confiança mútua entre ele e o ex-Diretor Geral MAURICIO VALEIXO. Que a troca de mensagens entre o ex-ministro SERGIO MORO e a depoente, de uma maneira geral, revela no entendimento desta um grau de confiança também existente dela com o ex-ministro;
Que a depoente consigna, inclusive, que à época dessas mensagens extraídas no celular do ex-ministro Sergio Moro, este já havia figurado como padrinho de seu casamento;
Questionada sobre a mensagem enviada ao ex-ministro SERGIO MORO em 17/04/202, esclarece que o Presidente JAIR BOLSONARO não chegou a externar desconfiança com o ex-diretor Geral MAURICIO VALEIXO, e que a mensagem foi no contexto de que o ex-ministro SERGIO MORO era desarmamentista, e por tal razão este e o Presidente JAIR BOLSONARO haviam tido “algo recente” e por esta mesma razão o Presidente não confiaria no delegado VALEIXO, então Diretor Geral da Polícia Federal, órgão responsável pela emissão de registros de porte de armas;
Com relação à mensagem de 21/04/2020, às 11:53h, entende não ter relação direta com os fatos investigados, sendo apenas mais uma tentativa da depoente no sentido de aproximar o Presidente JAIR BOLSONARO com o ex-ministro SERGIO MORO, à semelhança do que fez por meio do secretário NABHAN GARCIA, como indagado no início da oitiva;
Que com relação às mensagens enviadas pela depoente ao ex-ministro SERGIO MORO no dia 23/04/2020 esclarece que se tratava de uma tentativa de permanência de SERGIO MORO como Ministro da Justiça, após saber pela imprensa eventual decisão de pedido de exoneração; Que acrescenta que chegou a encaminhar imagem do índice da bolsa de valores em queda ao ex-ministro SERGIO MORO, e assim procedeu em razão do momento difícil do país, não oportuno ao eventual pedido de exoneração;
Que com relação a mensagem do dia 23/04/2020, às 18:45h, disse ao ex-ministro SERGIO MORO entender ‘sua frustração”, esclarecendo que esta “frustração”, na visão da depoente, não tinha relação com a troca do Diretor Geral da Polícia Federal e sim com “diversas derrotas” em iniciativas de projetos junto ao Congresso Nacional, como o pacote anticrime, por exemplo;
QUE com relação à mensagem do dia 23/04/2020, às 18:48h, disse ter sugerido ao ex-ministro SERGIO MORO aceitar o Delegado de Polícia Federal RAMAGEM, nome já na imprensa como possível sucessor; QUE a sugestão anterior do nome da Delegada ERIKA foi alterada para o Delegado RAMAGEM, em razão, como dito, de o nome de RAMAGEM já figurar na imprensa como possível sucessor; QUE a sugestão do nome do Delegado RAMAGEM não se deu em razão de conversa sua com o Presidente JAIR BOLSONARO;
Que com relação à mensagem do dia 23/04/2020, às 18h46min, sobre a eventual indicação do ex-ministro SERGIO MORO ao Supremo Tribunal Federal, tem o interesse de contextualizar que, como ativista, chegou a trabalhar junto ao então Presidente TEMER na indicação de IVES GANDRA MARTINS FILHO à vaga no STF do Ministro Teori,
e que poderia trabalhar junto ao Presidente JAIR BOLSONARO no sentido de o ex-ministro
SERGIO MORO vir a ocupar a futura vaga, com a vaga decorrente da aposentadoria próxima do Ministro CELSO DE MELO; Que tinha a perspectiva e vontade de o ex-ministro SERGIO MORO ser indicado para essa vaga no STF, como seu caminho natural; Que ainda com relação às mensagens do dia 23/04/2020, às 18:46, foram elas enviadas no sentido de
incentivar SERGIO MORO a permanecer no Ministério da Justiça; Que não chegou a ter qualquer conversa com o Presidente JAIR BOLSONARO no sentido de o ex-ministro SERGIO MORO aceitar a substituição da Direção da Polícia Federal, tendo como contrapartida a vaga no STF; Que não chegou a ter qualquer conversa com pessoas em nome do Presidente JAIR BOLSONARO, no sentido de o ex-ministro SERGIO MORO aceitar a substituição da Direção da Polícia Federal; Que procurou uma composição com o ex-ministro SERGIO MORO, a ele perguntando quem seriam eventuais nomes pelo ex-ministro, aceitos para assumir a Direção Geral da Polícia Federal; Que com relação a mensagem do dia 23/04/2020, às 18:51h afirma que ouvir falar por pessoas do Planalto que o Presidente JAIR BOLSONARO estava irredutível na troca da Direção Geral da Polícia Federal, em razão de ter competência para tanto, conforme mensagem do dia 23/04/2020, às 18:51h: “ele acha que, constitucionalmente, ele pode indicar”; Que não se recorda quem disse isto à depoente;
Que à depoente o ex-ministro SERGIO MORO não chegou a confirmar nem a refutar o nome do Delegado de Polícia Federal RAMAGEM para a Direção Geral, tendo SERGIO MORO dito que não iria mais tratar essas questões por escrito; Que ainda no dia 23/04/2020, a depoente estabeleceu contato ao telefone com o próprio Delegado MAURICIO VALEIXO, por meio de chamada no aplicativo whatsapp, em número de contato que já possuía, e teria escutado deste que já havia pedido demissão naquele dia, sem lhe revelar o motivo, porém o ex-ministro SERGIO MORO não havia aceito; Que inclusive nessa mesma ligação, o Delegado MAURICIO VALEIXO chegou a dizer que o Delegado RAMAGEM era um bom nome como sucessor e que ele, MAURICIO VALEIXO, faria uma transição no cargo de Diretor Geral da Polícia Federal;
Que se recorda ainda de ter estabelecido contato naquela oportunidade com FABIO WAJNGARTEN e com o ministro RAMOS, e ambos sugeriram que a depoente continuasse a manter contato com SERGIO MORO, “fazendo o possível” para que o mesmo permanecesse como ministro; Que a sua percepção, caso o ex-ministro SERGIO MORO não tivesse exoneração na sexta-feira, haveria tempo hábil no final de semana para composição do nome do novo Diretor da Polícia Federal;
Que minutos antes da coletiva de imprensa em que o SERGIO MORO pediu sua exoneração, a depoente ainda enviou mensagens ao ex-ministro, no sentido de demovê-lo da ideia de sair do Governo, não tendo naquela oportunidade algo novo a dizer a SERGIO MORO para convencê-lo;
Que SERGIO MORO não chegou a se encontrar com a depoente, reservando-se a responder “se o PR anular o decreto de exoneração, ok”.
Questionada se chegou a buscar junto ao Planalto saber as razões pelas quais o Presidente gostaria de colocar alguém de mais confiança na Superintendência da Polícia Federal no Rio de Janeiro, respondeu que não.
Questionada sobre como teve conhecimento do interesse do Presidente JAIR BOLSONARO na substituição no cargo de Superintende da Polícia Federal no Rio de Janeiro, respondeu que isto se deu por meio da imprensa.
Questionada se teve acesso ou conhecimento a algum dado objetivo da produtividade da Polícia Federal no Rio de Janeiro durante a gestão do Delegado RICARDO SAADI, respondeu que não.
Questionada mais uma vez sobre a mensagem do dia 17/04/2 , às 13:42h: “os casos da Lava Jato no Congresso precisam andar”, esclarece que tal afirmativa se deu em razão de não ter notícias de outras operações deflagradas com recentidade;
Questionada se a depoente chegou a perguntar ao ex-ministro SERGIO MORO sobre a
existência de algum inquérito específico, respondeu que chegou a mandar ao ex-ministro uma matéria em que a PGR cobrava conclusão de investigação sobre o deputado federal RODRIGO MAIA; Que esclarece que apenas perguntou se esse inquérito era de responsabilidade da Polícia Federal; Que essa pergunta partiu apenas da depoente e não do Presidente JAIR BOLSONARO por meio dela;
Questionada se em março de 2020 o Presidente JAIR BOLSONARO chegou a comentar com a depoente o desejo de substituição do Superintendente da Polícia Federal no Rio de Janeiro, respondeu que não;
Questionada sobre quando chegou a ter ciência da intenção do Presidente JAIR BOLSONARO em substituir o Diretor Geral da Polícia Federal, respondeu que isto se deu em abril de 2020;
Questionada se em agosto de 2019, teve conhecimento da manifestação pública do PresIdente JAIR BOLSONARO em substituir o Diretor Geral da Polícia Federal, respondeu que não se recorda;
Questionada sobre a relação entre o Presidente JAIR BOLSONARO e o ex-ministro SERGIO MORO, afirmou que em certas oportunidade havia uma aproximação entre ambos, como na época em que o ex-ministro SERGIO MORO sofreu ataques do site INTERCEPT, porém percebeu certo distanciamento nos últimos dois meses entre eles, não sabendo a razão razão precisa;
Questionada sobre a forma de tratamento entre a depoente e autoridades em geral, respondeu que se utiliza do cargo como vocativo.