Partido Socialista assume derrota e Portugal dá guinada à direita

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Lisboa — Nas eleições mais disputadas da história, e com 98% dos votos apurados, Portugal ainda não sabe qual legenda foi a grande vencedora da disputa travada neste domingo nas urnas, já que a diferença que separa as duas principais forças políticas, a Aliança Democrática (AD), com 29,6% da preferência do eleitorado, e o Partido Socialista (PS), com 28,7%, é de apenas 55 mil votos. O resultado final só será conhecido quando forem contabilizadas as cédulas oriundas do exterior, em especial, do Brasil e da França, onde estão milhares de eleitores. A contagem desses votos será feita entre 18 e 20 de março. Mas o líder do PS, Pedro Nuno Santos, já admitiu a derrota.

Um fato, porém, é certo: depois de oito anos de um governo socialista, Portugal deu ontem uma guinada à direita. Além do bom desempenho da Aliança Democrática (AD), liderada pelo Partido Social Democrata (PSD), houve um salto espetacular do Chega, legenda de extrema-direita, que obteve 18,1% dos votos ante os 7,2% computados em 2022. Esse espectro político avançou de Norte a Sul do território luso — venceu no Algarve — e passou de 12 para 46 deputados, um deles, Marcus Santos, o primeiro brasileiro eleito na história para a Assembleia da República. No total, o Chega teve mais de 1 milhão de votos.

A Aliança Democrática ficou com 77 assentos no Parlamento e o PS, com 74. No entender de especialistas, a nova composição de deputados terá importantes reflexos nas políticas que serão adotadas nos próximos meses, inclusive na área da imigração. O brasileiro Marcus Santos é um dos eleitos pelo Chega que defende uma política rígida de controle na entrada de cidadãos estrangeiros em Portugal, em especial daqueles oriundos de países muçulmanos. Os representantes da ultradireita estimulam a xenofobia e o racismo.

“Não é não”

A grande dúvida a ser dirimida nos próximos dias é se a Aliança Democrática irá se coligar com o extremista Chega a fim de obter a maioria parlamentar e indicar o próximo primeiro-ministro de Portugal. Poucos dias antes de os portugueses irem às urnas, o líder da AD, Luís Montenegro, afirmou que não havia a menor possibilidade de seu grupo se unir à ultradireita. “Não é não”, enfatizou ele. Há, no entanto, uma grande divisão dentro de seu próprio partido — uma ala defende o casamento com a legenda comandada por André Ventura. Mas, como na política tudo pode mudar da noite para o dia, o suspense é grande.

Ventura já se antecipou e mostrou disposição para um acordo com a Aliança Democrática. “Os portugueses querem dois partidos no comando no país”, frisou. Segundo ele, as eleições deste domingo marcaram o fim do bipartidarismo em Portugal e, diante o que se viu nas urnas, é preciso que haja responsabilidade da direita no sentido de formar um governo. “A direita precisa ter responsabilidade com o país. Só um ato de irresponsabilidade, de deixar o Partido socialista governar, pode afastar um acordo. Vamos ouvir o que Luís Montenegro tem a dizer. Os portugueses já disseram o que querem nas urnas e deram uma resposta ao presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, que quis condicionar os votos dos cidadãos”, disse.

O líder do Partido Socialista, Pedro Nuno Santos, afirmou que, apesar dos votos que ainda estão por ser contados, a vitória será da Aliança Democrática. “Assumo a derrota e quero ressalta que estamos na oposição. Não queremos deixar o país em suspenso por mais de 15 dias. Não vamos formar uma maioria alternativa”, enfatizou. Para ele, deve-se considerar ainda o expressivo do Chega, que teve 18,1% dos votos. “Foram mais de 1 milhão de votos de portugueses xenófobos e racistas, mas a maioria dos cidadãos do país não compartilha desses pensamentos. Estamos prontos para a luta e vamos reconstruir as condições para que o PS possa voltar a governar Portugal”, ressaltou.

As eleições em Portugal foram antecipadas em dois anos. Em novembro passado, uma operação do Ministério Público apontou indícios de corrupção no governo, o que levou à renúncia do socialista António Costa do cargo de primeiro-ministro. Diante desse fato, o presidente português optou por dissolver a Assembleia da República e convocou nova votação. Até agora, nenhuma das acusações foram confirmadas. Costa, por sinal, afirmou que esse fato teve peso importante na ascensão do Chega, assim como a disparada da inflação e a subida dos juros, que prejudicaram o bem-estar dos cidadãos. “O certo é que essas eleições só ocorressem em outubro de 2026”, ressaltou.

Saúde e habitação

Diante da acirrada disputa entre os partidos, os portugueses aproveitaram a trégua dada pela chuva e pela neve e foram votar. Com isso, a abstenção caiu para 33,8%, ante os 48,6% de dois anos atrás. Dois e cada 10 eleitores decidiram em quem votariam na última semana. A maioria dos indecisos era de mulheres entre 35 e 64 anos. “Não se pode ficar em casa de chinelos, sentado no sofá vendo televisão. É preciso votar para ter o direito de reclamar dos políticos e dos partidos”, disse o aposentado Carlos Varandas, 64 anos.

Para o também aposentado Vítor Antunes, 67, o voto foi uma conquista importante, do qual os portugueses não podem abrir mão. “Sei bem o que foi a ditadura nesse país. Votei pela primeira vez aos 18 anos e, desde então, nunca deixei de cumprir com meu dever cívico” assinalou. No entender dele, o fato de a maior parte dos eleitores ter optado por empurrar Portugal para a direita não deve ser motivo de medo, desde que a guinada seja ligeira. “A alternância de poder sempre ocorreu no país, sabemos bem como funciona”, acrescentou.

Segundo Maria da Graça, 69, os principais problemas a serem enfrentados pelo futuro governo estão na saúde, na educação e na habitação. Os cidadãos têm enfrentado sérios problemas no atendimento na rede pública de hospitais, por causa da escassez de médicos e enfermeiros, que levou ao fechamento de várias emergências de unidades de saúde. Nas escolas, falta professores, e a qualidade do ensino caiu. Já os preços dos alugueis e dos imóveis para compra dispararam, devido ao aumento da demanda por parte dos imigrantes, sobretudo, brasileiros. Na visão de Francisco Felipe, 71, os políticos devem olhar mais para a população e menos para seus interesses pessoais. “É o que todos esperam”, assinalou.

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Fonte correiobraziliense
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