Entenda em oito pontos a crise do governo com a Receita, PF e Coaf

Disputa sobre autonomia de postos-chave acentua indisposições; há possibilidade de renúncia coletiva de auditores

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RIO – O governo do presidente Jair Bolsonaro enfrenta, no momento, tensões que envolvem a autonomia de postos-chave da Receita Federal,da Polícia Federal (PF) e do Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf).

As indisposições foram acentuadas na semana passada, diante da intenção de Bolsonaro substituir o superintendente da PF no Rio e outros três chefes da Receita no estado. A possibilidade levou o diretor-geral da polícia a cogitar um pedido de demissão e ainda pode fazer com que auditores fiscais promovam uma renúncia coletiva em resposta ao governo.

No caso da Receita Federal, autoridades de outros poderes como o presidente da Câmara, Rodrigo Maia, e o ministro do Supremo Tribunal Federal, Alexandre de Moraes, também já apresentaram críticas à atuação do órgão, o que vem aumentando a pressão sobre mudanças no Fisco.

Abaixo, em oito pontos, os principais fatores que têm colocado em xeque a atuação da Receita, Polícia Federal e Coaf.

Receita Federal

Decisão de Alexandre de Moraes

Em 1º de agosto, o ministro do STF Alexandre de Moraes determinou a suspensão de um procedimento de investigação da Receita relativo a 133 contribuintes, entre eles ministros da própria Corte e outras autoridades. O magistrado afirmou que há “graves indícios de ilegalidade” relativos à apuração, comprometida, segundo ele, por desvios de finalidade e falta de critérios objetivos para a escolha dos alvos. Moraes também determinou o afastamento de dois servidores que participaram do procedimento.

Críticas de Maia e Bolsonaro

Em entrevista ao “Roda Viva”, da TV Cultura, em 12 de agosto, o presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia (DEM-RJ), disse que “há algum excesso nos atos da Receita” e que é preciso cuidado para que ela não seja utilizada indevidamente. O parlamentar deixou claro, no entanto, que não se referia ao caso suspenso pelo STF. Na mesma semana, em 14 de agosto, Bolsonaro afirmou em entrevista coletiva que o órgão fez uma “devassa” na vida financeira de sua família residente na região do Vale do Ribeira, no interior de São Paulo. Ele também afirmou que o mesmo ocorreu com as próprias finanças antes da eleição do ano passado, com o objetivo de “derrubá-lo na campanha”.

Novo comando e transformação em autarquia

As críticas públicas de autoridades, em especial as de Bolsonaro, aumentaram a expectativa entre integrantes da equipe econômica do governo de que Marcos Cintra, secretário especial da Receita, deixe o cargo. Há uma possibilidade de que ele passe a chefiar somente uma área responsável por formular políticas, ligada diretamente ao Ministério da Economia. Em uma reunião com parlamentares no início do mês, Cintra ouviu críticas de Bolsonaro pelo que seria uma investida do Fisco contra um dos irmãos do presidente, Renato (ele é comerciante e veterano na política). Outra bronca, também diante de parlamentares, já tinha acontecido em maio, quando a pauta era a flexibilização das obrigações fiscais das igrejas. Além da saída de Cintra, também é cogitada a transformação do setor de fiscalização da Receita em uma autarquia (a intenção é “trancá-la num lugar bem longe em que nenhum braço vai chegar”, conforme afirmou o ministro Paulo Guedes em 15 de agosto).

Interferência politica em postos-chave

Desde o dia 17 de agosto, auditores fiscais temem que se concretize a ameaça do governo de exonerar os ocupantes de três postos-chave da Receita no Rio: o superintendente do órgão no estado (Mário Dehon); o delegado da alfândega do porto de Itaguaí (José Alex de Oliveira) e a chefe do Centro de Atendimento ao Contribuinte (CAC) da Barra da Tijuca (Adriana Trilles). Informado pelos colegas de que será exonerado do cargo, Oliveira divulgou um comunicado em um grupo de aplicativo para alertar que o interesse na troca viria de “forças externas que não coadunam com os objetivos de fiscalização da Receita Federal, pautados pelo interesse público e defesa dos interesses nacionais”.  Em resposta ao governo, o presidente do sindicato dos auditores fiscais (Sindifisco), Kleber Cabral, disse ao GLOBO que se a substituição de Dehon for confirmada, o governo terá como resposta uma renúncia coletiva de chefes em todos os níveis de hierarquia da Receita.

Polícia Federal

Substituição no Rio de Janeiro

Em entrevista coletiva concedida em 15 de agosto, Bolsonaro anunciou que iria substituir o superintendente da Polícia Federal (PF) no Rio de Janeiro, Ricardo Saadi, por problemas de “gestão e produtividade”. O presidente não entrou em detalhes sobre o motivo da troca e nem sobre quando ela seria concretizada. O presidente da Associação Nacional dos Delegados da PF, Edvandir Paiva, se manifestou sobre o caso e disse que não cabia a Bolsonaro trocar o superintendente, mas sim ao diretor-geral da PF.

‘Quase demissão’ do diretor-geral

A pressão do presidente para a troca de comando no Rio quase resultou no pedido de demissão do diretor-geral da PF, Maurício Valeixo. Esse foi o motivo para que Bolsonaro amenizasse o tom das declarações. Segundo um delegado que acompanha o caso de perto, Bolsonaro pressionou a direção da PF a substituir imediatamente Saadi porque estava descontente com uma investigação no órgão.

Coaf

Investigações paralisadas

Em 17 de julho, o presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), ministro Dias Toffoli, determinou a suspensão de todos os processos judiciais em que dados bancários de investigados tenham sido compartilhados por órgãos de controle, como o Coaf, sem autorização prévia do Judiciário. A decisão foi dada em resposta a um pedido do senador Flávio Bolsonaro (PSL-RJ). Em dezembro passado, um relatório do Coaf apontou movimentação financeira atípica de Fabrício Queiroz, ex-assessor de Flávio na Assembleia Legislativa do Rio (Alerj). Desde então, o Ministério Público do estado investiga suposto desvio de dinheiro público por Flávio em seu antigo gabinete na Alerj por meio da prática de “rachadinha” — apropriação de parte do salário de assessores. A defesa do filho do presidente argumentava que a investigação teria irregularidades porque o repasse de dados do Coaf não teria sido intermediado pela Justiça.

Transferência para o Banco Central

O governo prepara uma medida provisória (MP) para transferir o Coaf para o Banco Central (BC). O objetivo seria evitar pressões políticas em torno das decisões do órgão, mas críticos afirmam que a mudança é uma maneira de limitar a atuação, restringindo-a a questões técnicas. Com a confirmação da transferência, o Coaf deve receber um novo nome (Unidade de Inteligência Estratégica) e a presidência será assumida por alguém indicado pelo presidente do BC, Roberto Campos Neto. O nome mais cotado é o do economista Ricardo Liáo, atual diretor de supervisão do Coaf.

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Fonte oglobo
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