Carne Angus era vendida abaixo do preço ou descartada em esquema usado para lavar dinheiro de cestas básicas, diz polícia
Produto era comprado no Rio Grande do Sul e vendido em mercado de Palmas. TV Anhanguera e g1 tiveram acesso à decisão que autorizou o cumprimento de mandados contra empresários e o governo do estado.
Os investigadores da Polícia Civil descobriram que uma parte do dinheiro ilegal adquirido pelo esquema de fraudes na compra de cestas básicas era lavada por meio da compra de carne bovina da raça Angus. O produto era colocado à venda em um mercado de Palmas, mas quando não tinha saída era vendido com preço de carnes bovinas mais baratas, utilizado na fabricação de linguiças ou até mesmo descartado.
O esquema de fraude na distribuição de cestas básicas durante a pandemia foi alvo da operação realizada nesta quarta-feira (27) pela Diretoria de Combate à Corrupção e ao Crime Organizado (DRACCO). Até o momento são sete pessoas investigadas, incluindo dois servidores do governo do estado que foram afastados das funções. Além dos afastamentos, os agentes também cumpriram mandados de busca, apreensão e sequestro de bens.
A decisão que autorizou a operação revela que estão sendo investigadas duas empresas ligadas ao mesmo grupo de empresários. As firmas assinaram 21 contratos com a Secretaria do Trabalho e Desenvolvimento Social (Setas), ao custo total de R$ 23 milhões, para fornecer 286 mil cestas básicas e 30 mil frangos. Todas as contratações foram feitas com dispensa de licitação.
As investigações começaram ainda em janeiro deste ano e são referentes a contratos assinados entre abril de 2020 e dezembro de 2021, durante o governo de Mauro Carlesse (PSL), que renunciou ao cargo durante um processo de impeachment. A fraude teria começado com uma das empresas e depois os envolvidos migraram para a segunda firma.
Os investigadores apuraram que o grupo adquiria produtos das cestas básicas a custo de atacado e vendia para o governo a preço de varejo. A análise das notas fiscais também revelou uma grande quantidade de itens que efetivamente não foram entregues. O governo teria pagado, por exemplo, por 30 mil frangos congelados e recebido somente 10 mil unidades.
O prejuízo estimado, apenas em produtos que não foram entregues, é de R$ 1.852.788. A estimativa dano total aos cofres públicos é superior a R$ 4,9 milhões.
Lavagem de dinheiro
A polícia identificou que o dinheiro adquirido pela fraude era transferido para contas bancárias de empresas operadas por laranjas. Os investigados também compravam veículos, mas o que mais chamou a atenção dos investigadores foi um mercado que supostamente funcionava como fachada para o grupo criminoso.
A polícia descobriu que eles compravam uma grande quantidade de carne de bovinos da raça Angus em um frigorífico no Rio Grande do Sul. A quantidade era tão desproporcional à demanda do mercado que chamou atenção até do fornecedor.
Uma testemunha contou á polícia que os cortes da raça Angus chegavam a ser vendidos como carnes ordinárias, da raça nelore, ou até mesmo utilizados na fabricação de linguiça quando não havia saída esperada. Isso servia para lavar o dinheiro do crime e atribuir um fluxo de caixa irreal.
A operação
A Polícia Civil realiza uma operação na manhã desta quarta-feira (27) para investigar possíveis fraudes em contratos de compra de cestas básicas praticadas pelo governo do Tocantins. Mandados de busca e apreensão são cumpridos na sede da Secretaria do Trabalho e Desenvolvimento Social (Setas) e em um condomínio de luxo, onde moram alguns dos alvos. A suspeita é que quase R$ 5 milhões tenham sido desviados.
Sete pessoas são investigadas. A suspeita é de que cestas básicas que deveriam ter sido usadas para atender famílias que foram prejudicadas economicamente pela pandemia de Covid-19 não tenham sido efetivamente entregues enquanto as empresas contratadas recebiam o valor adiantado.
A ação é uma extensão de uma operação realizada em janeiro deste ano. Na época uma força-tarefa da Diretoria de Repressão à Corrupção e ao Crime Organizado (DRACCO) cumpriu mandados em Palmas e Guaraí.
O que diz a Setas e o ex-governador Mauro Carlesse
A Secretaria do Trabalho e Desenvolvimento Social (Setas) informa que está colaborando com as investigações da Polícia Civil, prestando todas as informações solicitadas.
O órgão reitera que os seus atos administrativos são regidos dentro das boas práticas da transparência e da legislação. É importante ressaltar que os processos referentes às aquisições e aos contratos realizados respeitaram o período pandêmico, bem como Decreto de Calamidade Pública, salientando que todas as informações pertinentes estão disponíveis no Portal da Transparência.
Por fim, a Setas reforça que o órgão preza pelas boas práticas da gestão pública e é contra qualquer ilícito, tendo seus processos analisados internamente e também passando pelo crivo dos órgãos de controle.
O ex-governador Mauro Carlesse afirmou, em nota, que em relação a investigação da Polícia Civil sobre a aquisição de cestas básicas é importante esclarecer o que segue:
O ex-governador Mauro Carlesse deixou a administração estadual em 20 de outubro de 2021. E segundo a própria reportagem nos informou, as investigações em curso tiveram início em janeiro de 2022, sobre um contrato assinado no mês de novembro de 2021, ou seja, já durante a gestão atual do Governo. Inclusive é fato público, que os atos de extorsão que deram início às investigações ocorreram após a assinatura deste contrato citado anteriormente. Portanto, sem nenhuma relação com a gestão Mauro Carlesse;
Cabe destacar, que o ex-governador jamais foi responsável pela gestão de contrato de aquisição de cestas básicas, cabendo aos responsáveis pelas referidas despesas prestarem as informações necessárias às investigações.