Sucesso dos veículos elétricos depende de mais infraestrutura
O Tecmundo noticiou há alguns dias o incômodo que os carros elétricos estão causando em motoristas nos Estados Unidos, a ponto de 20% deles voltarem aos modelos à gasolina, segundo pesquisa feita pela Universidade da Califórnia. O causador dessa dor de cabeça seria a demora no tempo de carga das baterias dos veículos elétricos (VEs).
Como comparação, um Ford Mustang comum leva três minutos para encher o tanque e roda 480 quilômetros. Já um elétrico Mach-E precisa ficar uma hora conectado a uma tomada doméstica para rodar apenas cinco quilômetros. A reportagem ainda esclarece que o padrão das tomadas residenciais norte-americanas é de 120 volts de energia, chamadas de “Nível 1”. O ideal para as recargas de VEs são as conexões “Nível 2”, com 240 volts – algo a que mais de 70% dos usuários não têm acesso, em casa ou no trabalho. Já os postos Superchargers da Tesla fornecem tomadas de 480 volts de energia, em que as baterias demoram pouco mais de uma hora para atingir a carga de 100%.
Por outro lado, esta semana foi anunciado pela Volkswagen – maior produtora de veículos do mundo – o encerramento da produção de carros a gasolina e a diesel, voltando seus investimentos para os carros elétricos. Vale lembrar que a Audi, que pertence ao Grupo Volkswagen, já havia feito o mesmo anúncio recentemente.
Em entrevista à Automobilwoche, Ralf Brandstätter, CEO da Volkswagen, afirmou que a montadora alemã continuará atualizando e revisando os atuais motores a combustão a gasolina e diesel, para torná-los mais eficientes. Tudo indica que essa transição deve acontecer nos próximos dez anos, até 2030 – ano em que a montadora deseja que metade de suas vendas na Europa sejam de VEs.
Desafios de infraestrutura
Os entusiastas do modal elétrico, como eu, se pegam num dilema ao acompanhar esse noticiário contraditório: se nem os Estados Unidos conseguem prover uma rede de postos elétricos eficiente para prover uma a recarga, como podem grandes montadoras planejarem abandonar os carros a combustão?
Mais uma vez, o cerne da questão recai na necessidade de investimentos em infraestrutura. E na ponderação sobre cases de países em que o modal está dando certo, como Portugal. Em Lisboa, os carros elétricos ocupam vagas de recarga nas ruas, sendo abastecidos com energia pública. O código daquela vaga depois chega na residência ou ponto comercial do motorista, como uma espécie de “EstaR” ou “Zona Azul”.
Os governos do Paraná e de São Paulo também têm se dedicado a esta questão, com isenções e reduções de impostos voltados ao fomento dos veículos elétricos. Ainda podemos citar a eletrovia da Copel, com uma rede de eletropostos que está criando um smart grid na nossa região.
Voltando ao caso da Volkswagen, um dos desafios para a implantação dos carros elétricos são países como o Brasil, com ações preliminares de incentivo para a adoção desses veículos. Mesmo diante dos percalços, a gigante alemã pretende lançar no país, até 2023, seis modelos de carros elétricos ou híbridos – como o Golf de oitava geração, na versão híbrida GTE.
Especialistas ouvidos na reportagem do Tecmundo reforçam que a tendência dos incômodos na recarga dos elétricos, caso se mantenha, pode dificultar a transição não somente nos Estados Unidos, mas em outros países. “Não se deve presumir que, dado que um consumidor adquira um elétrico, ele continuará possuindo um”, escrevem Scott Hardman e Gil Tal, pesquisadores da Universidade da Califórnia.
Sem investimentos, não existe possibilidade de evoluir neste modal, apesar das vantagens sustentáveis que já abordamos em outras oportunidades nesta coluna. E o mesmo também acontece quando o planejamento urbano e governamental das cidades e estados abrange as ciclovias e os modais de mobilidade ativa.
Da mesma forma em que, no passado, houve um esforço conjunto do poder público e iniciativa privada para popularizar e viabilizar a malha viária nacional para os carros a combustão e a diesel, estamos diante de um momento histórico de se investir pesadamente em postos e tomadas eficientes para recargas de veículos elétricos.
***
Beto Marcelino, colunista do TecMundo, é engenheiro agrônomo, sócio-fundador e diretor de relações governamentais do iCities, empresa de projetos e soluções em cidades inteligentes, que organiza o Smart City Expo Curitiba, maior evento do Brasil sobre a temática com a chancela da FIRA Barcelona.