Sob novo marco regulatório, energia solar distribuída cresce e já soma mais de 4% do consumo
Produção em micro e miniusinas solares atingiu 1.828 MW médios, crescimento de 80% na comparação anual
A geração própria de energia elétrica vem ganhando cada vez mais espaço no Brasil, com o volume produzido em painéis solares instalados em residências, comércios e indústrias já representando 4,3% de todo o consumo do mercado regulado, segundo um levantamento da Câmara de Comercialização de Energia Elétrica (CCEE), que foi antecipado à Reuters.
A quantidade de consumidores que possuem a “geração distribuída” — micro ou miniusinas com até 5 megawatts (MW) de potência — ainda é relativamente pequena, mas já vem afetando o mercado da distribuidoras, uma vez que esses clientes passam a consumir menos energia da rede.
A fatia da geração distribuída também se torna relevante para uma tecnologia que era incipiente até poucos anos atrás no Brasil, um dos países que lideram a expansão da energia solar no mundo, junto de China, Estados Unidos, Índia e União Europeia.
Segundo os dados da CCEE, no primeiro semestre, a produção de energia em micro e miniusinas solares atingiu 1.828 MW médios, um crescimento de 80% na comparação anual.
A CCEE considera que todo esse volume gerado foi consumido, correspondendo aos 4,3% do consumo total de 42.600 MW médios no mercado regulado no período. Já em capacidade instalada, a geração distribuída solar atingiu 11.315 MW no país, o equivalente à capacidade da usina de Belo Monte (PA), a maior hidrelétrica 100% brasileira.
A potência alcançada na primeira metade do ano representa uma adição de mais de 2 GW frente aos 9 GW do fim de 2021, evidenciando a adoção acelerada de uma tecnologia que, há quatro anos, não havia nem ultrapassado a marca de 1 GW.
“De um lado, temos a demanda crescente da sociedade por mais sustentabilidade e, do outro, um apetite grande dos investidores, tornando esse mercado ainda mais atrativo”, disse o presidente do Conselho de Administração da CCEE, Rui Altieri.
Segundo Altieri, a geração distribuída tem se tornado cada vez mais relevante na matriz nacional e certamente continuará ampliando sua representatividade. Ele ressalta a importância de se monitorar o crescimento da tecnologia, para que o setor elétrico possa alcançar “uma rede ainda mais robusta e um mercado muito bem equilibrado”.
A energia solar também vem crescendo através da construção de grandes complexos da fonte, classificados como “geração centralizada”. No primeiro semestre, esses projetos produziram 1.207 MW médios de energia, 64% acima no comparativo anual.
As grandes “fazendas solares” também estão atrás da geração distribuída em potência, somando pouco mais de 5 GW no país.
Nova lei
Já amplamente adotada nos EUA e Europa, a geração distribuída ganhou um marco regulatório no Brasil em janeiro, o que vem ajudando a impulsionar a adesão dos consumidores à modalidade neste ano, já que alguns benefícios serão mantidos para quem começar a gerar até janeiro de 2023.
Hoje, empreendimentos de geração distribuída operam com um sistema de compensação: o consumidor proprietário da usina recebe um crédito na conta de luz pelo saldo positivo de energia gerada e inserida na rede, após descontado seu consumo. Além disso, o segmento é isento do pagamento de alguns componentes tarifários, como a tarifa de uso do sistema de distribuição.
Segundo um relatório de maio, da Agência Internacional de Energia (IEA, na sigla em inglês), o crescimento do mercado de renováveis no Brasil deve atingir novo recorde em 2022, principalmente pelos benefícios à adoção da energia solar distribuída.
Incentivos à tecnologia também têm levado ao crescimento de todo o mercado de energias renováveis na União Europeia e Índia neste ano, apontou a IEA.
Distribuidoras
O crescimento das micro e miniusinas solares, com até 5 megawatts (MW) de potência, também implica uma redução do mercado das distribuidoras de energia, que já vinha encolhendo por conta das migrações de consumidores ao mercado livre.
As concessionárias vêm sentindo os impactos do avanço da geração distribuída em suas receitas, já que essas instalações deixam de consumir da rede quando estão produzindo sua própria energia.
No caso da paranaense Copel, o mercado faturado da distribuidora cresceu 0,5% no segundo trimestre na base anual, a 7.798 GWh, considerando uma subtração de 255 GWh de mini e microgeração. Desconsiderando o efeito da geração distribuída, o mercado teria crescido 1,7% no período.
Já a Cemig, que distribui energia em Minas Gerais, estado onde a geração distribuída mais cresce, a tecnologia representou 5,3% do total da energia consumida no primeiro trimestre, com 631 GWh. A elétrica ainda não divulgou dados do segundo trimestre.
A Neoenergia, que controla cinco distribuidoras, também disse sentir os efeitos da geração distribuída sobre o negócio, principalmente no Rio Grande do Norte.
Em teleconferência na semana passada, executivos da elétrica explicaram que, pela nova lei, esses impactos serão neutralizados para as distribuidoras na próxima revisão tarifária.
Há, porém, um efeito também no portfólio de contratos de energia das concessionárias. Com menor consumo, as empresas ficam sobrecontratadas — o que pode se tornar um problema, já que em níveis acima de 105%, as distribuidoras não são autorizadas a repassar os custos para as tarifas e têm que arcar com eles.
“Sobre a sobrecontratação, o impacto que gera, estamos exatamente numa discussão com a Aneel sobre isso, deve ser considerado como involuntário”, comentou Solange Ribeiro, diretora da Neoenergia, na semana passada.