Klabin propõe retrocesso em governança, mas BNDES pode reduzir problema
Depois de avanços em 2020, o conselho proposto pelos controladores só tem sobrenome de fundadores
O BNDES segue, todo santo pregão, vendendo ações da companhia de embalagens Klabin, que vale mais de R$ 30 bilhões na B3. A participação do banco na empresa já caiu para cerca de 3%, ante os 7,5% do início de 2021. As vendas diárias começaram a acontecer em fevereiro e incluíram um grande bloco no dia 18 do mês passado. A instituição fechou o ano passado com aproximadamente 84 milhões de units e tem hoje perto de 33 milhões. Já embolsou, portanto, cerca de R$ 1,5 bilhão e há ainda mais R$ 1 bilhão de saldo.
Mas, antes de ir embora de vez, o banco pode evitar um retrocesso na governança corporativa da empresa, que está prestes a acontecer. A chapa que a família controladora propôs para formação do conselho de administração de 2021 eliminou os membros externos e voltou a ser uma longa lista de Lafers e Klabins. Se desacelerar a venda de papéis até 24 de março, data da assembleia anual, o BNDES pode ajudar a reduzir esse problema.
Depois de avançar em diversas frentes no ano passado, como o fim do contrato de royalties com os controladores pelo uso do nome Klabin, a criação de uma política financeira e outra de dividendos, a Klabin escolheu voltar a ser alvo de críticas do mercado.
As únicas exceções de familiares na chapa proposta pelos controladores são as indicações dos Monteiro Aranha — Sérgio Francisco Monteiro de Carvalho e Camilo Marcantonio Júnior.
O colegiado da Klabin é considerado historicamente exagerado na quantidade e na participação de familiares, mas havia melhorado em 2019 e em 2020. Neste ano, foram retirados da chapa indicada pela família José Luiz Freire, sócio-fundador do escritório TozziniFreire Advogados, e Pedro Marcílio, ex-diretor da Comissão de Valores Mobiliários (CVM). E foram colocados de volta Celso Lafer e Francisco Lafer Pati.
O BNDES indicou para eleição em separado, pelos preferencialistas, Mauro Rodrigues da Cunha para reeleição. É o terceiro ano do ex-presidente o Instituto Brasileiro de Governança Corporativa (IBGC) e da Associação de Investidores no Mercado de Capitais (Amec) no colegiado. Com Rodrigues da Cunha, o conselho proposto pelos controladores tem 13 membros.
O acionista minoritário Luiz Barsi, que possui algo como 2% das ações preferenciais da Klabin, quis indicar para o conselho Heloisa Bedicks, também ex-presidente do IBGC. Para que o nome de sua candidata pudesse constar do boletim de voto à distância e receber indicações para o caso de uma eleição por voto múltiplo, ele montou uma chapa inteira concorrente. A única diferença em relação ao coletivo sugerido pelos controladores é que sai Paulo Sérgio Coutinho Galvão Filho, do grupo Raia Drogasil e filho de Graziela Klabin Galvão, e entra Heloisa. Um pedido de vaga que chegou com uma bandeira branca.
Os controladores da Klabin têm, entre holdings e participações não vinculadas a acordos, a maioria do capital votante. Portanto, há pouca ou nenhuma dúvida que a chapa da família está eleita.
A única forma de garantir a eleição de Heloisa Bedicks, portanto, é pela solicitação de voto múltiplo — depende que os pedidos alcancem 5% do capital votante — e que algum ou alguns acionistas concentrem nela seus votos.
O BNDES pode ser crucial nessa conta: garantindo a eleição de Heloisa, além da indicação de Rodrigues da Cunha para votação em separado. Assim, os membros externos da família cairiam de cinco para quatro e não para três. Mas, se seguir vendendo sua posição, talvez não consiga fazer tanta diferença.
Barsi, quem propôs a chapa, quase nada tem a contribuir além de ter garantido o nome no boletim, pois sua posição em ações ordinárias, como se sabe, é irrisória.
No processo de voto múltiplo, cada ação passa a dar direito a tantos votos quantas vagas existirem no conselho. A distribuição desses votos fica a cargo do acionista, que pode escolher concentrá-los em um único nome de forma a garantir a eleição de determinado candidato.
As consultorias de recomendação de voto podem ajudar, com a escolha pela chapa de Barsi, um dos mais famosos e maiores investidores do varejo brasileiro. Com recomendações favoráveis de ISS e Glass Lewis, os estrangeiros seriam importantes para a nomeação de Heloisa. A expectativa é que os relatórios sejam conhecidos até o fim desta semana.
O BNDES, que foi fundamental na negociação do fim do contrato de royalties, pode ser relevante mais uma vez, contribuindo para que o conselho de uma das mais tradicionais indústrias brasileiras não retroceda — não tanto, ao menos — em sua governança.
A presença de membros totalmente externos às famílias nas formações do conselho de 2019 e 2020 tinha relação direta com a discussão dos royalties e a tentativa de obter aprovação do banco, maior investidor minoritário. Quando os controladores fizeram um acordo de paz com a instituição, há dois anos, para sentar e conversar sobre o tema, a indicação de membros totalmente independentes de fato e de direito foi uma exigência para o diálogo.
A lista de 2019 tinha ainda José Amaury Bier, que não foi reconduzido em 2020, pois era uma indicação temporária acordada com o banco por um ano e que os controladores não mantiveram no ano seguinte. E, agora, com a questão da marca solucionada, as famílias também não reconduziram nem Freire, nem Marcilio.
Os membros independentes praticamente levam o mérito por saberem apertar os botões corretos e serem um dos fomentadores dos caminhos e pressões criados para incentivar controladores e BNDES a encontrarem uma posição de consenso, quando diversas vezes tudo parecia perdido. Essa é só uma demonstração da relevância de ter um conselho independente.
Na assembleia anual, além da eleição do conselho, as companhias abertas também aprovam a proposta de remuneração anual global. O valor sugerido pela Klabin para este ano é pouco maior do que R$ 58 milhões, ante os cerca de R$ 50 milhões pagos em 2020. O conselho de administração responde por uma parcela praticamente estável desses totais, em torno de R$ 17 milhões.