Receita Federal fecha o cerco contra artistas da Globo
43 contratados da emissora são investigados por possível fraude
Revelada em janeiro, a ofensiva da Receita Federal contra 43 dos principais artistas da rede Globo se intensificou. Depois de uma devassa nos contratos, agora devem chegar as primeiras cobranças de impostos retroativos aos atores e atrizes que pertencem ao primeiro time da emissora.
Caso o órgão do governo federal entenda que houve fraude ao fisco, devido a contratos firmados não com os artistas, mas com pessoas jurídicas, eles teriam que arcar com um valor equivalente ao total do que receberam pelo trabalho na emissora.
Reynaldo Gianecchini é um dos artistas na lista de notificações da Receita Federal. “Trabalho há 20 anos e desde sempre paguei um monte de impostos que o governo me cobrou. Como pode a Receita Federal, agora, dizer que tudo aquilo não valeu?”, questiona o ator, em comunicado.
“Com oito anos eu já trabalhava. Fiz filmes, peças de teatro, campanhas publicitárias e coproduções de longas. E, para fazer tudo isso, no Brasil ou no mundo, tem que ser através de uma pessoa jurídica”, argumenta Deborah Secco.
Advogado tributarista que defende os 43 artistas da Globo, Leonardo Antonelli, irmão da atriz Giovanna Antonelli, revelou que a Receita Federal também passou a vasculhar neste mês de agosto os chamados direitos conexos, que são os valores que os atores recebem pelas obras audiovisuais de que participaram. Essas quantias são pagas quando novelas são reprisadas ou exibidas no exterior, por exemplo. “Nunca houve isso na história artística brasileira”, disse o advogado ao blog Na Telinha.
A Globo, que nos últimos anos passou a substituir contratos de jornalistas, executivos e apresentadores de PJ para CLT, defende em comunicado que todas as suas formas de contratação estão dentro da lei.
No caso de artistas e alguns jornalistas, a vantagem de ser contratado como uma “empresa” é a possibilidade de vincular ao contrato ganhos com publicidade e merchandising, que são devidamente declarados.
“Alguns faturam muito mais com a publicidade nas suas redes sociais do que na própria Globo, principalmente aqueles com milhões de seguidores, que criam os próprios canais, atraindo mais audiência do que certos programas de TV”, alega o advogado dos artistas.
A pessoa física é taxada em até 27,5% do Imposto de Renda, além do INSS. E a jurídica recolhe, ao todo, de 6% a 16%, dependendo da atividade e faturamento. O advogado tributarista destaca que, apesar da taxação sobre a renda ser inferior, o contratado como PJ não tem os benefícios trabalhistas e ainda arca com outros impostos para a União, que já foram pagos ao longo dos anos.
“As empresas brasileiras, incluídas nesse rol aquelas pertencentes aos atores, são obrigadas a pagarem uma série de tributos sobre suas receitas, tais como o PIS, Cofins, Contribuição Social Sobre o Lucro, Imposto de Renda Pessoa Jurídica, ISS, contador e alvará. E esses valores pagos por eles não poderão, no futuro, serem devolvidos na hipótese do entendimento da Receita prevalecer, pois já estará prescrito o direito de eles pedirem de volta”, explica Antonelli.
Apesar de outras grandes emissoras, como SBT, Record, Band e RedeTV!, terem parte de seus artistas, executivos e jornalistas contratados como PJ, não há informações que os profissionais dessas empresas tenham recebido notificações para prestar contas ao fisco. Também não há indícios de que a ex-secretária de Cultura, Regina Duarte, e o atual, Mário Frias, ex-funcionários da Globo, tiveram as contas examinadas.
O presidente Jair Bolsonaro já declarou que considera o Grupo Globo seu “inimigo” e chegou a sugerir que pode não renovar a concessão para que a empresa continue a operar seus canais de TV. Após acusar a Globo de praticar “jornalismo sujo”, Bolsonaro registrou sua ameaça num vídeo, divulgado em novembro do ano passado.
“Pague tudo o que deve. Certidões negativas, tudo. Para não ter problema. Não vou passar a mão na cabeça de ninguém. Da Globo nem de ninguém. Vocês têm que tá em dia para renovar a concessão. Tô avisando antes para não dizer que estou perseguindo vocês”, declarou o presidente na ocasião, mais transtornado que o costume, mas em seu habitual estilo retórico de dizer que não está fazendo o que está fazendo.
Ele também mandou diminuir a verba de publicidade federal destinada ao grupo de comunicação da Globo e há indícios de que séries e filmes da empresa possam ter dificuldades para conseguir incentivos ou acesso à verba do FSA (Fundo Setorial do Audiovisual).
Para completar, neste mês acionou a Rede Globo na Justiça pelo direito de resposta às críticas do Jornal Nacional (JN) sobre a atuação do governo no combate ao surto de coronavírus. Segundo a Advocacia Geral da União apresentou-se “indevidas ilações sobre uma suposta omissão deliberada por parte do Governo Federal, no contexto de combate à pandemia do gerada pelo covid-19”.