TCU condena Deltan e Janot a devolverem gastos da Lava Jato

Procurador João Vicente Romão também foi condenado. Trio deverá ressarcir aos cofres públicos R$ 2,8 milhões gastos em diárias e passagens com integrantes da força-tarefa. Eles negam irregularidades e irão recorrer.

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A Segunda Câmara do Tribunal de Contas da União (TCU) condenou nesta terça-feira (09/08) o ex-procurador-geral da República Rodrigo Janot, o ex-procurador Deltan Dallagnol e o procurador João Vicente Romão a devolverem aos cofres públicos, de forma conjunta, R$ 2,8 milhões gastos com pagamento de diárias e passagens a integrantes da força-tarefa da Lava Jato em Curitiba, extinta em 2021.

Deltan foi coordenador da força-tarefa em Curitiba, e neste ano deve ser candidato a deputado federal pelo Podemos do Paraná. Romão era o procurador-chefe da Procuradoria da República no Paraná quando a força-tarefa estava ativa. Além da devolução dos recursos, o trio foi condenado a pagar multa individual de R$ 200 mil cada um. Eles recorrerão da decisão.

O caso vinha sendo investigado pelo TCU desde 2020, que apontou irregularidades no pagamento de diárias e passagens de 2014 a 2021. A força-tarefa da Lava Jato em Curitiba usava procuradores de outras cidades do país, mas eles não eram formalmente transferidos para a capital paraense. Por isso, recebiam diárias e passagens para atuar na cidade.

A Lava Jato foi a maior operação anticorrupção da história do país, que levou à prisão grandes empresários e políticos importantes, como o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. O uso farto de prisões provisórias e de condenações baseadas em delações premiadas, porém, provocou muitas contestações.

Em 2019, um grande vazamento de mensagens entre os procuradores e o juiz Sergio Moro mostrou que havia coordenação de estratégias entre a acusação e o magistrado. A força-tarefa também recebeu muitas críticas de que teria objetivos políticos e partidários, acentuadas pela posterior ida de Moro para comandar o Ministério da Justiça no início do governo Jair Bolsonaro. A condenação de Lula, que o tirou da campanha eleitoral de 2018 e era considerada um ponto alto da força-tarefa, foi anulada em 2021 pelo Supremo Tribunal Federal.

Qual foi o argumento pela condenação

O TCU concluiu que a solução adotada não representava o menor custo possível para os cofres públicos e resultava em rendimento extra irregular em favor dos beneficiários. Nos autos do processo, consta o pagamento de R$ 2,6 milhões em diárias e passagens a cinco procuradores de 2014 a 2021, dos quais um teria recebido os valores apesar de morar em Curitiba e outro ser casado com uma procuradora residente em Curitiba.

No despacho que autorizou a abertura da investigação, o ministro Bruno Dantas, do TCU, afirmou que esse modelo de atuação “viabilizou uma indústria de pagamento de diárias e passagens a certos procuradores escolhidos a dedo, o que é absolutamente incompatível com as regras que disciplinam o serviço público brasileiro”.

Dantas foi o relator do caso e concluiu que o modelo havia sido prejudicial aos cofres públicos ao permitir o pagamento “desproporcional” e “irrestrito” de diárias, passagens e gratificações, e ofendido o princípio da impessoalidade. Ele mencionou que, além das diárias, os procuradores já recebiam também auxílio-moradia, no valor de R$ 4.300 mensais.

Dantas ressaltou que a força-tarefa poderia ter optado por procuradores que já atuavam em Curitiba, ou que se estruturasse na forma de Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado (Gaeco). Ele mencionou ainda que força-tarefa é uma forma de organização excepcional e que não deveria ter sido utilizada por sete anos.

Seu relatório foi aprovado por quatro votos a zero. Janot foi condenado por ter autorizado a constituição da força-tarefa em Curitiba, Deltan, por ter participado da concepção do modelo e da escolha dos integrantes, e Romão, por ter solicitado a formação da força-tareda.

Outros sete procuradores que atuaram na força-tarefa e receberam os pagamentos foram inocentados, pois segundo o TCU não incorreram em “prática de ato de gestão, tampouco erro grosseiro”. São os procuradores Antonio Carlos Welter, Carlos Fernando dos Santos Lima, Diogo Castor de Mattos, Isabel Cristina Groba Vieira, Januário Paludo, Jerusa Burmann Viecili e Orlando Martello Júnior.

A área técnica do TCU havia concluído que não houve irregularidades na força-tarefa e recomendou o arquivamento do processo. Segundo os auditores, o modelo de força-tarefa era o melhor considerado à época para aquela finalidade, e qualquer opção para estruturar a Lava Jato envolveria custos. O procurador Rodrigo Medeiros de Lima, representante do Ministério Público junto ao TCU no processo, acompanhou as conclusões da área técnica do TCU.

O que os procuradores afirmam

Janot afirmou ao TCU que não havia praticado ato de gestão, de comando ou de ordenação de despesa no tocante à força-tarefa em Curitiba.

Em novembro do ano passado, ele disse à TV Globo que “é um exagero, um absurdo tentar responsabilizar, de forma indireta, uma pessoa por atos que não são da sua competência”. Segundo ele, “o TCU não pode interferir na atividade finalística de nenhum órgão de controle. Estranhamente a decisão do relator não analisou a eficácia e a eficiência das investigações no modelo adotado pelo Ministério Público. A atividade de controle não é mercadoria de feira que, quanto mais barata, melhor”.

Deltan afirmou ao TCU que o modelo havia sido aprovado por órgãos superiores do Ministério Público Federal, e que o modelo de força-tarefa já havia sido exitoso em outros casos.

Nesta terça-feira, ele afirmou, em nota, que a condenação era uma perseguição pela sua atuação como procurador: “A decisão dos ministros desconsidera o parecer de 14 manifestações técnicas de 5 diferentes instituições (…) que referendaram a atuação da Lava Jato e os pagamentos feitos. Tudo isso com o objetivo de perseguir o ex-procurador Deltan Dallagnol e enviar um claro recado a todos aqueles que lutam contra a corrupção e a impunidade de poderosos.”

Ele também questionou a independência dos ministros que o julgaram: “Discordando dos 4 ministros políticos do TCU que condenaram Deltan Dallagnol, todos delatados na Lava Jato, o ministro substituto André Luis, que veio da área técnica e não tem direito a voto, no fim do julgamento, pediu a palavra para elogiar ironicamente o ministro relator Bruno Dantas pela coragem de condenar quem combateu a corrupção, contra as manifestações técnicas, enquanto os tribunais estão livrando a cara de quem realmente praticou corrupção”.

A condenação não deve afetar a elegibilidade de Deltan neste ano, pois o TCU encaminha à Justiça Eleitoral o nome dos agentes públicos que tiveram suas contas julgadas irregulares em definitivo, ou seja, quando não há mais possibilidade de recurso.

Romão afirmou ao TCU que não havia praticado ato de gestão, de comando ou de ordenação de despesa, e que havia dificuldades práticas para a implementação de outras alternativas para a constituição da força-tarefa.

O que é o TCU

Apesar de ter “tribunal” em seu nome, o TCU não é um órgão do Judiciário. Trata-se de um órgão auxiliar do Congresso Nacional para analisar os balanços financeiros e orçamentários e a administração do patrimônio da União.

Seus nove ministros são indicados por critérios políticos, e não precisam necessariamente ser formados em Direito, mas devem ter conhecimentos em áreas como economia, finanças e administração pública.

O órgão tem um corpo de servidores concursados que avaliam as prestações de contas, e tem uma função importante para controlar o gasto de recursos públicos no país.

bl (ots)

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Fonte dw
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