Por que o preço do óleo de cozinha disparou no Brasil e no mundo
Depois do tomate, da cenoura e da gasolina, a disparada da inflação já tem um novo vilão no Brasil e no mundo: o óleo de cozinha.
Segundo dados de abril do IPCA (Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo), índice do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) que mede a inflação do país, o preço do óleo de soja subiu 20,37% no acumulado desde o início do ano.
Nos últimos 12 meses, a alta é de 31,53%.
Pela internet, diversos supermercados e e-commerces já vendem o litro do óleo de soja a mais de R$ 10.
O aumento está pesando tanto no bolso dos brasileiros que nas redes sociais internautas têm discutido substituir o óleo de soja por outros produtos, entre eles a banha de porco.
Mas a disparada nos preços do produto não é exclusividade do Brasil. Globalmente, o valor dos óleos vegetais aumentou 46,5% nos últimos 12 meses, segundo o Índice de Preços de Alimentos da Organização das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação (FAO).
Segundo especialistas consultados pela BBC News Mundo, serviço em espanhol da BBC, vários fatores influenciam o aumento de preços, entre eles o atual conflito entre Ucrânia e Rússia, uma alta na inflação em todo mundo e uma queda na produção global de óleos vegetais associada a uma grande demanda.
O ‘ouro líquido’
Essa escalada nos preços do óleo — e dos combustíveis e alimentos em geral — ocorre no contexto de inflação galopante que afeta todo o mundo, impulsionada principalmente pela guerra na Ucrânia e pelos efeitos econômicos da pandemia de covid-19.
O valor dos alimentos no mundo disparou tanto que as organizações internacionais alertaram para o aumento da fome nos países mais pobres.
Na América Latina, a inflação do produto no ano passado cobre uma faixa muito ampla que vai de 9% na Bolívia a mais de 60% em países como a Costa Rica.
No Chile, por exemplo, uma garrafa de pisco (uma das bebidas alcoólicas mais populares do país) já é mais barata que uma de óleo em alguns supermercados.
O preço do óleo de soja, que já foi está sendo apelidado de “ouro líquido”, aumentou 67% entre janeiro e abril deste ano nos supermercados chilenos, segundo o Escritório de Estudos e Políticas Agropecuárias (ODEPA), enquanto o óleo de girassol (também conhecido como óleo de calêndula) subiu 63,6%.
No México, o óleo de cozinha é o produto cujo preço mais aumentou entre os alimentos de uma cesta básica, segundo o Instituto Nacional de Estatística (INEGI).
No Reino Unido, Espanha, Itália e Alemanha foram aplicadas políticas de racionamento, com alguns supermercados estabelecendo um limite de compra entre um e três litros por pessoa por dia.
Ao mesmo tempo em que se aplica o racionamento, é cada vez mais comum encontrar prateleiras vazias.
O problema não é apenas que o preço subiu, mas que em alguns estabelecimentos simplesmente não há óleo disponível em estoque.
Neste vídeo publicado no Twitter, clientes de um supermercado no Chile parecem desesperados para conseguir óleo em um supermercado.
Em países como Colômbia e México, o aumento no preço do produto foi de cerca de 40%, enquanto em outros como Guatemala, Panamá ou Equador, o aumento foi —em média— superior a 20%.
Os equatorianos também usaram as redes sociais para expressar seu desconforto com o preço da garrafa de um litro de óleo, que custa US$ 6 (R$ 30) em algumas lojas.
Esses são valores estimados que buscam refletir uma média dos aumentos em diferentes partes de um país. Mas os preços dependem do bairro, da cidade, do supermercado e da marca do óleo.
Uma análise do preço em dólares do litro de óleo vegetal segundo dados enviados por alguns correspondentes da BBC Mundo ajudam a entender a relação entre o custo do produto e o salário mínimo em alguns países.
Óleo de girassol e guerra
Dentre todos os óleos vegetais disponíveis no mercado, o que se encontra em maior escassez e, portanto, está mais valorizado, é o óleo de girassol.
Conhecidos como “o celeiro da Europa”, Ucrânia e Rússia responderam por 71% das exportações de óleo de girassol no ano passado, segundo a ISTA Mielke GmbH, empresa especializada em análise do mercado global de petróleo, com sede em Hamburgo, na Alemanha.
Com a guerra, a oferta caiu para níveis mínimos, problema que se soma à queda da produção dos últimos anos que já colocava o mercado em apuros.
‘Uma grande preocupação’
Alejandro Betancourt, especialista em óleo da ISTA Mielke GmbH, diz que a produção global de óleos vegetais diminuiu nos últimos anos.
Os preços dos quatro principais óleos – girassol, palma, colza (canola) e soja – “triplicaram desde 2019”.
Essa situação se agravou nos últimos dois meses, disse ele à BBC Mundo, devido à guerra na Ucrânia e à queda acentuada nas exportações de óleo de palma, tanto devido à menor produção quanto às restrições de exportação impostas na Indonésia.
“Há uma grande preocupação com a inflação dos preços dos alimentos e a piora da oferta de alimentos”, diz.
‘A Tríplice Crise’
E o futuro não parece muito animador por enquanto, explica Gustavo Idigoras, presidente da Câmara Argentina da Indústria do Petróleo e Centro Exportadores de Cereais.
O mercado de petróleo “não tem perspectiva de estabilização. Temos que nos preparar para pelo menos dois anos de preços altos” a partir do momento em que a guerra terminar, disse ele à BBC Mundo.
A situação é complexa porque há outros fatores influenciam o atual aumento de preços, além das secas que vêm afetando a produção global.
Por um lado, o fim da pandemia aumentou o consumo de petróleo e a guerra na Ucrânia reduziu a oferta.
Mas há outro elemento em jogo, explica ele, que é fundamental: a alta demanda por óleos vegetais para uso na indústria de biocombustíveis.
“É uma crise tríplice devido à pandemia, biocombustíveis e guerra”, diz Idigoras.
Com reportagem de Cecilia Barría, da BBC News Mundo