Injustiçado pela seleção. Letal, o maior de todos com a camisa do Vasco. Adeus a Roberto Dinamite
708 gols na carreira. 702 só pelo Vasco da Gama. Atacante subestimado pela história. E pela seleção brasileira. Foi o grande rival e amigo maior ainda de Zico. O Barcelona o desperdiçou. Sorte do futebol deste país
São Paulo, Brasil
Domingo, 4 de maio de 1980.
Quitaúna, Osasco
Eu fazia parte da equipe de recrutas que fazia a guarda do quartel do 2º Grupo de Artilharia Antiaérea, naquele fim de semana.
Depois de duas horas com fuzil na mão, guardando o fundo do quartel, pude ir à sala de descanso, acompanhar, com mais recrutas e um cabo, um jogo de futebol
A pequena tela de televisão era o nosso oásis, enquanto não chegava a hora de voltar para a vigilância. Os turnos eram corridos, duas horas na guarda e quatro horas descansando.
Tive sorte de acompanhar um dos jogos inesquecíveis que guardo na minha memória afetiva.
Vasco da Gama e Corinthians, no Maracanã.
Caçapava, volante moderno para a década de 80, com físico de halterofilista, marcou 1 a 0 para o Corinthians. A sala de descanso quase veio abaixo. Recrutas pulando, chutando almofadas, virando água do cantil. E o cabo calado.
Aí, Roberto Dinamite marca quatro gols em seguida.
Incrédulos, os recrutas passam a se olhar, sem entender o que se passava. Foi uma antevisão do que eu viveria no Mineirão, nos 7 a 1 para a Alemanha.
Sócrates aliviou o sofrimento, a vergonha, marcando 4 a 2.
Mas, inclemente, Roberto Dinamite marcou seu quinto gol.
O cabo que estava quieto começou a gritar, comemorar.
Foi para fora e deu cinco tiros de pistola para o alto.
Pensamos que ele havia enlouquecido e tratamos de correr para o alojamento.
Foi assim que Roberto Dinamite se apresentou a mim.
Mais tarde tive a chance de entrevistá-lo algumas vezes, quando veio por um período rápido, emprestado, à Portuguesa, no final de carreira.
Chegou a me falar da injustiça que sofreu no Barcelona, contratado para substituir o austríaco Krankl. Joaquim Rifé era o treinador que o indicou. Mas logo depois que Roberto Dinamite chegou, Rifé foi demitido.
Helenio Herrera chegou à Catalunha e não apoiou o brasileiro. Sem visão, não queria um homem de referência na área.
E Roberto Dinamite voltou para o Brasil, depois de apenas três meses no Barcelona, três gols marcados.
O Flamengo havia feito melhor proposta, mas ele preferiu o Vasco. Abriu mão de formar uma dupla fabulosa com Zico.
Para quem não viu Roberto Dinamite jogar, a melhor definição veio do melhor jogador do Flamengo, de todos os tempos,
Ele mesmo, Zico.
Roberto Dinamite. ‘Artilheiro à frente do seu tempo’, definição do maior rival, Zico
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“O Roberto era um jogador sensacional. Muito moderno para a época. Ele fazia várias funções no ataque. Vinha com a bola dominada dos dois lados do campo. Era ótimo pivô. Batia falta com violência e precisão. E dentro da área era quase imarcável”, disse em 2006.
Roberto Dinamite ficou traumatizado com o descaso no Barcelona. E, mesmo com propostas para sair, preferiu completar 19 anos de Vasco da Gama.
Reinou absoluto nas redes no Campeonato Brasileiro.
Marcou 190 gols.
No Carioca, também reina sozinho.
Nada menos do que 279 gols.
Chegou a 708 na carreira.
Após o fim da carreira foi deputado estadual pelo Rio de Janeiro. Por cinco mandatos seguidos.
Teve dois mandatos conturbados como presidente do Vasco.
Mas como atleta será inesquecível.
São 702 gols só pelo clube da Cruz de Malta.
Roberto Dinamite sempre me tratou bem demais.
Inteligente, acessível, sabia como se portar como ídolo.
Merece um lugar na história do futebol brasileiro maior do que teve enquanto jogava.
Me arrependo de não ter contado a Roberto a bagunça, os tiros do cabo para o alto, nos cinco gols que marcou contra o Corinthians.
Teria se divertido.
Descanse em paz, Roberto…