Se a Selic for a 4% neste ano, o retorno da renda fixa pode virar perda. Prepare-se
Veja no que investir caso esse cenário tão inédito para o brasileiro realmente se concretize
A taxa Selic, hoje em 5,5% ao ano, está no menor patamar da história. O mercado, no entanto, aposta que ela vai continuar caindo e pode chegar até 4% ainda este ano. E se isso acontecer, alguns títulos de renda fixa podem ter uma rentabilidade real (descontada a inflação) negativa no ano.
É isso mesmo que você leu: a renda fixa brasileira que já chegou a dar ganhos acima de 20%, com um risco bem controlado, pode passar a te render nada e ainda, descontando a inflação do período, corroer um pedaço do patrimônio total que você aplicou (esse é o conceito de rentabilidade real negativa, ou juro real negativo)
Isso acontece porque muitos produtos de renda fixa têm sua rentabilidade atrelada à taxa básica de juros. Então, se ela está menor, o retorno daquela aplicação também fica baixo. E se um retorno de 4% ao ano já não é tão interessante assim, imagine se descontarmos a inflação no mesmo período? Isso pode significar nada de ganhos, ZERO!!!!
Portanto, caso a Selic chegue a 4% neste ano (como já estão estimando alguns economistas e instituições, como o Itaú Asset Management) e a inflação seja de 3,28% ao ano – projeção do mercado, segundo o relatório Focus para o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) -, o juro real será de 0,70%, segundo cálculos do Valor Data.
Nesse cenário, descontadas as taxas como a custódia, o Imposto de Renda e a inflação do período, um título do Tesouro Selic te ofereceria perdas de 0,21% ao ano. Já a poupança, descontando a inflação apenas, já que não há incidência de taxas e ela é isenta de imposto de renda, traria uma perda real de 0,46% e o CDI (índice que acompanha de perto a taxa básica de juros e serve como indexador de muitos investimentos), também descontando a inflação, perdas de 0,06%.
Caso a Selic continue a 5,5% ao ano e a inflação no final de 2019 seja de 3,28% como prevê o mercado, o rendimento real do Tesouro Selic será de 0,99% neste ano. Já a poupança, renderá 0,55%. Nada de brilhar os olhos, mas todo mundo ainda no campo positivo.
No ano passado, com a taxa Selic na casa dos 6,5% ao longo do ano, os juros reais da economia ficaram em torno de 2,6%.
E agora? Dá pra continuar no Tesouro Direto?
Para ter rendimentos semelhantes aos do ano passado (com juros reais em torno de 2,6%, que já não é nenhuma Brastemp), Bruno Saads, principal executivo de renda fixa da XP Investimentos, afirma que o investidor conservador “pense além dos instrumentos tradicionais”, como Tesouro Selic e Poupança.
Ele sugere que o investidor coloque 5% de seus recursos em títulos prefixados (em que o rendimento é acordado na hora da compra) com vencimentos mais longos. Atualmente, um Tesouro Prefixado 2022 rende 4,95% ao ano, enquanto o Tesouro Prefixado 2025 rende 6,15% ao ano.
“Em um cenário de Selic a 4%, isso já traz uma ‘gordura’ de rentabilidade. Só que tem o risco da Selic voltar a subir, então, é importante não apostar só nisso“, afirma.
Outra sugestão, então, é colocar pelo menos 10% da carteira em títulos atrelados à inflação, ou seja, em que os rendimentos acompanhem a alta dos preços do mercado. Isso mantém o chamado “poder de compra” do consumidor.
Vale destacar, contudo, que tanto no título prefixado quanto no papel atrelado à inflação, se o investidor mantiver a aplicação até o vencimento vai receber o retorno acordado no momento da compra — o risco é se ele precisar sair do investimento no meio do caminho e a taxa de juro no mercado secundário tiver mais alta, gerando perdas com a desvalorização do papel.
Saads afirma, porém, que também é importante continuar com parte da carteira aplicada no Tesouro Selic, para manter a liquidez e se proteger caso aconteça uma alta da taxa básica de juros novamente.
E se eu topar sair do Tesouro Direto?
Para quem topa se aventurar para além do Tesouro Direto, Saads sugere títulos de crédito privado, principalmente debêntures (onde você “empresta dinheiro” para uma empresa, e não para o governo, como é no Tesouro Direto).
“Recentemente a Petrobras fez uma emissão e foi muito procurada pela pessoa física. Se o investidor encontrar uma empresa consolidada, conhecida, que o ‘rating’ da dívida seja bom, vale a pena investir em uma debênture“, afirma. Ele pondera, contudo, que há o risco de crédito. Ou seja, de tomar um ‘calote’ daquela empresa.
“É o risco para ter uma ganho um pouco maior. Por isso é importante pesquisar bastante sobre aquela companhia”, diz. Ele sugere também os CDBs (títulos de dívida dos bancos), mas afirma que eles são menos líquidos que as debêntures.
Já para Michael Viriato, coordenador do laboratório de finanças do Insper, o investidor precisa entender qual é o seu perfil. “Não adianta dizer para o conservador ir para a bolsa. Se ele é conservador, ele tem que entender que agora o cenário é outro. Os juros são menores e ele vai ter um rendimento mais baixo”, diz.
Ele afirma, porém, que “nada impede que o investidor busque ganhos um pouco maiores”, mesmo na renda fixa. O especialista concorda que uma das saídas é procurar produtos de crédito privado, como debêntures e CDBs. “Só é preciso lembrar que, para ter esses rendimentos maiores, o risco também é maior. Há o próprio risco de crédito nesses casos, em que o emissor daquela dívida não paga”, afirma.