Análise: Novo pacote tem potencial para gerar emprego, mas pode ter fôlego curto
Para economistas, medidas se concentram no segmento mais afetado pela crise, os jovens de 18 a 29 anos
RIO – O pacote lançado nesta segunda-feira pelo governo de Jair Bolsonaro tem o objetivo de gerar quatro milhões de empregos até dezembro de 2022. O programa tem potencial para criar vagas para os jovens, o segmento mais atingido pela crise. Especialistas ponderam, porém, que a medida pode ter fôlego curto, por seu caráter temporário, de apenas dois anos.
A meta do projeto abrange o Programa Verde e Amarelo, destinado aos jovens, com forte desoneração sobre a folha de pagamentos, para atrair empresas; a permissão para o trabalho aos domingos e feriados; a ampliação do microcrédito; e ações de reabilitação de trabalhadores afastados do serviço por causa de acidentes e doenças.
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Na avaliação do economista Marcelo Neri, o programa é uma resposta imediata ao desalento entre os jovens, grupo que se deparou nos últimos anos com um mercado retraído e com poucas oportunidades.
— A medida vai criar oportunidades para os jovens, por mérito, pois foi o grupo que mais sofreu durante a crise e são os principais perdedores. Por outro lado, é a força de trabalho que é o futuro do país. Eles se encontram em uma armadilha: não têm experiência e, por conta disso, não têm emprego. Mas também corre-se o risco de eles tirarem o emprego de quem já está estabelecido. O cobertor é curto. — analisa Neri.
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Segundo dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (PNAD Contínua), do IBGE, no Brasil, um em cada quatro jovens não estuda nem trabalha. Trata-se de um contingente de 10, 9 milhões de brasileiros, entre 15 e 29 anos, o que corresponde 23% das pessoas nessa faixa etária.
De acordo com o economista, o pacote tende a ajudar na formalização:
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— O grande problema hoje é que alguns têm muitos direitos, outros não têm direito nenhum porque não têm emprego. Esse pacote é uma solução intermediária. O pacote dá uma oportunidade de experiência, de crescimento profissional do jovem e tende a ajudar na formalização — conta Neri.
O economista José Marcio Camargo acredita que desoneração foi concentrada no grupo de trabalhadores que tem maior taxa de desemprego e a maior informalidade:
— Desse ponto de vista é perfeitamente correto. Você só deve desonerar aqueles que estão na informalidade ou aumentar o emprego — afirma Camargo.
Segundo o especialista, a medida pode ser considerada como uma medida política, uma vez que visa o bem estar social da população.
— Tem um viés político no sentido de reduzir o desemprego. E isso gera mais bem estar social.
A barreira de entrada no mercado de trabalhovem diminuindo nos últimos meses com a lenta recuperação da oferta de empregos nos últimos 12 meses. Levantamento do GLOBO mostra que a retomada do emprego formal, ainda que lenta, tem sido puxada por jovens de até 24 anos. Entre outubro de 2018 e setembro deste ano, cerca de 1,1 milhão de jovens foram contratados com carteira assinada em todo o país, segundo dados do Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged).
Para Fernanda Leite, a advogada trabalhista e sócia do escritório Tocantins Advogados, a medida pode ter fôlego curto:
— A primeira faixa, de 18 a 29 anos, acaba não tendo um trabalho no qual consiga se fixar, porque a medida tem duração de apenas dois anos e não garante longevidade. Com a redução na contribuição para o FGTS e menor porcentagem para a multa rescisória, o jovem não tem nenhuma garantia após ser mandado embora.
Perda de receita
Bruno Ottoni, pesquisador associado do FGV IBRE e IDados, avalia que em princípio o pacote pode surtir efeito no sentido de ajudar na criação de novas vagas por reduzir os custos do empregado para os empresários.
Ottoni pondera, no entanto, que o governo, em um momento de déficit fiscal, abre mão de receitas previdenciárias relevantes o que pode minar a confiança de investidores no pacote:
— Este pacote pode ajudar no longo prazo, mas no curto prazo pode não surtir muito efeito até porque se trata de uma medida provisória que deverá ser analisada, modificada e congresso. Outro problema é que eles (a equipe econômica) vão ter explicar essa perda de receita, em um momento em que o país está numa situação fiscal complicada. Vai haver uma perda de fonte de receita, mas ainda não se falou como isso será compensado, o pode reduzir a confiança dos empresários no pacote e nas contratações — avalia o pesquisador.
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Luiz Migliora, professor da FGV Direito Rio, pondera que, se o pacote anunciado pelo governo conseguisse estimular a criação de novas vagas, a questão fiscal poderia ser mitigada pela inserção de novos postos no mercado formal de trabalho.
Ele lembra, porém, que as medidas, com a inserção de uma nova modalidade de contratação, criam duas categorias de trabalhadores: a dos tradicionais e aqueles “incentivados”, cujos custos de contratação serão reduzidos em 34%.
Segundo ele, o risco é a substituição de mão de obra regular, com todas as contribuições, especialmente a previdenciária, por trabalhadores regidos pelas novas regras:
— Esse plano depende de uma fiscalização bem feita para evitar substituição de mão de obra. Se forem criados novos postos, será muito bom. Mas se houver substituição o governo perde dinheiro da Previdência e há perda de direitos trabalhistas. A rigor o pacote vai criar uma categoria nova de empregados que para o empregador é uma tremenda vantagem. Hoje, o emprego custa 60% em encargos, com esta proposta o custo cai pela metade. É um ótimo negocio, mas trabalhador e governo estão pagando a conta sozinhos — pondera.
Maior contratação no fim do ano
A medida chega um pouco antes do reaquecimento da economia no fim do ano, quando o comércio costuma ter mais demanda de mão de obra por causa das compras de Natal. Com o anúncio do pacote, o empresário Marcelo Doria, responsável pelo Depósito da Lingerie, uma rede de lojas de lingerie na zona leste de São Paulo, pretende crescer em 30% o quadro de funcionários.
— Geralmente nós contratamos uma mão de obra sazonal no final do ano. Com essa desoneração, pretendemos admitir mais funcionários e ter um número maior de vendas — comenta Doria.
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A empresa, que conta com 15 lojas na capital paulista, tem cerca de 150 funcionários. O empresário acredita que a medida possibilitará maior geração de emprego. Segundo ele, o alto custo tributário é um impeditivo para o crescimento das médias empresas.
— Isso destrava a contratação. O empresário acaba sendo penalizado por crescer. Essa desoneração vai possibilitar ao empreendedor que está que está expandindo gerar mais emprego, com isso o negócio se torna mais sustentável — diz Marcelo, que, com a economia nas contratações, pretende investir na capacitação profissional dos funcionários.