Mesmo com 2ª onda da pandemia, festa tradicional indígena será mantida na Ilha do Bananal
Hetohoky é uma das festividades mais importantes e bonitas dentre as realizadas pelos povos Karajá e Javaé. No ano passado, a cerimônia realizada em março, na Aldeia Fontoura, não contou com a presença de convidados (não-índios) em razão da pandemia.
Neste ano não será diferente.
O procurador do Ministério Público Federal (MPF), Alvaro Manzano, conversou com a Gazeta e esclareceu que não é o caso impedir a festa. “Nós fizemos uma reunião com o Distrito Sanitário Especial Indígena (DSEI/Araguaia) e as lideranças indígenas das aldeias que vão fazer as festas”, afirmou.
Como dito pelo procurador não há motivo para não realizar as festividades, pois boa parte da população indpigena já foi vacinada. “fizemos algumas recomendações de prevenção, entre elas a não participação de não índios. Além disso, uma equipe do DSEI estará presente para orientar o cumprimento das medidas de prevenção”, destacou.
Festa
Os Karajá nunca interrompem a festa quando ela já está em seu rito final. Toda condução é responsabilidade do Cacique Cultural, Isaque Waxiô Karajá, enquanto o Cacique Administrativo, Clebe Ixydeo Karajá atua na na coordenação e articulação com órgãos e entidades parceiras. São vários meses de trabalho até a chegada dos convidados – neste ano, a Fontoura recebeu grupos das aldeias Santa Isabel, JK, Watau, Werebia, Werreria, Tytemy, Krehawa, Macaúba, Kaxiwe, Ibutuna, Hawalora e Itxalá. É preciso alimentar a todos e ainda construir as duas casas centrais da festa, uma menor, representando o Norte, para abrigar os Aruanãs (espíritos protetores), e a do Sul, para receber os cinco garotos (Jyré ou Diré), que passaram duas semanas ouvindo ensinamentos sobre caça, pesca, regras de convivência social e outras orientações de um preceptor.
Rituais
No primeiro dia da festa, os garotos que entraram na Casa Grande são adornados para receber os convidados. Grande parte dos homens da aldeia passam dias preparando suas pinturas corporais e seus adornos – saias, ahetôs (cocares), colares, brincos. A festa é aberta pelo Cacique Cultural e, na sequência, o que se vê é um espetáculo de cores, cânticos e danças realizadas pelos homens, que percorrem a aldeia e fazem evoluções em dois pátios, até a recepção dos convidados das outras aldeias, que chegam pelo rio Araguaia.
Os homens passam a noite acordados. Ocorrem lutas tradicionais e a disputa para ver qual grupo conseguirá derrubar a “grande tora”, penosamente fincada no meio do pátio, próximo à Casa Grande.
No domingo, ao amanhecer, as famílias dos Diré/Jiré se reúnem no pátio, para acompanhar mais brincadeiras e receber os Aruanãs, que percorrem o pátio até os meninos, entre cantos e danças. Em seguida, toda a família segue para a Casa Grande. É o único momento em que as mulheres podem entrar no local. É o fim da festa, mas não desta história de resistência cultural Karajá.
Povo Iny
Os Karajá fazem parte do povo Iny (lê-se Inã, que significa “nós”), que inclui também os Karajá-Xambioá e os Javaé. Essencialmente coletores e pescadores, após longo período de migração e guerras com outras etnias, principalmente com os Xavante, eles se fixaram na Ilha do Bananal.
Neste período do ano, em que boa parte da Ilha está submersa, o acesso ao lado ocupado pelos Karajá se dá pelo Mato Grosso, de onde se pegam voadeiras (pequenas embarcações movidas a motor), nas cidades de São Félix do Araguaia e Luciara. Mas para entrar nas aldeias é necessária autorização prévia da Funai e das lideranças de cada aldeia.
A confecção de objetos de cerâmica, a pintura corporal e as bonecas Ritxokò (tombadas como patrimônio cultural brasileiro) são tradicionais da cultura Karajá. Outros destaques são as festas e rituais, em especial o Hetohoky , o Aruanã, a Festa do Mel, a Homenagem aos Mortos – Itxeo, a Festa da Alegria – Maarasi.
O povo Iny mantém a tradição por meio de seus rituais e celebrações. Ensinam aos descendentes a importância e a necessidade da transmissão destes conhecimentos milenares. As festas têm caráter religioso e são realizadas durante a época de fartura alimentar, quando figuras míticas dos espíritos protetores (Aruanãs) cantam e dançam para os participantes.