Até quando Witzel sobrevive?
Sem aliados políticos e investigado por vários desvios na área da Saúde, o governador do Rio de Janeiro está perto de sofrer impeachment e poderá ser o sexto ocupante do cargo a parar na cadeia
O governador do Rio de Janeiro, Wilson Witzel, deve ser o político na ativa mais solitário do Brasil neste momento. Seu isolamento é incalculável. Sem aliados em qualquer esfera e investigado pelo desvio, em plena pandemia, de milhões de reais na área da Saúde, Witzel vê o processo de impeachment contra ele na Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro (Alerj) prosperar rapidamente. E se enrola cada vez mais nas esferas criminal e administrativa por causa de acusações de corrupção. Está sob o fogo cruzado da Procuradoria Geral da República (PGR) e do Ministério Público do Estado, que investigam suspeitas de peculato, fraude em licitação e organização criminosa, entre outros delitos, e negociam o compartilhamento de provas. A ameaça que vai definir seu futuro vem do ex-secretário da Saúde Edmar Santos, que foi preso sob acusação de pertencer a um grupo que fraudou contratos de compra de respiradores pulmonares e medicamentos, em só uma das irregularidades detectadas. Na terça-feira 14, Santos fechou com a PGR um acordo de delação premiada com poder explosivo para derrubar o governador em curto prazo. Ele entregou provas que revelam, em detalhes, a participação de Witzel no esquema.
Criminalmente, o cerco ao governador está se fechando. Em sua defesa, ele disse que não é “ladrão” e que “não deixará que corruptos e bandidos estejam no seu governo”. “Todas as acusações levianas, que estão sendo feitas contra mim, são por parte de gente que não quer um juiz governando o Rio de Janeiro”, completou. A antiga cúpula da Secretaria da Saúde foi parar na cadeia e a polícia descobriu R$ 8,5 milhões em dinheiro vivo atribuídos a Edmar Santos. As investigações em andamento mostram que grande parte dos recursos destinados para a Saúde na atual situação de emergência, que dispensa licitações, foi desviada em superfaturamentos e contratações forjadas. Apenas uma organização social (OS), a Iabas, recebeu R$ 256,6 milhões para implantar e gerir sete hospitais de campanha para a Covid-19 e não conseguiu cumprir nenhum prazo de entrega. Respiradores foram adquiridos por preços muito superiores aos do mercado, com superfaturamento de R$ 5 milhões, entrre outras falcatruas.
“A Alerj descumpriu quatro pressupostos fundamentais para abertura do processo”, afirma o advogado Manoel Peixinho, que defende Witzel do impeachment. No seu mandado de segurança, Peixinho alega, por exemplo, que houve irregularidade na formação da comissão de impeachment, que deveria ter 18 deputados e não 25. Além disso, ele acusa a Alerj de ter prosseguido com as denúncias contra o governador sem elementos probatórios mínimos, “no escuro, à míngua de provas”. “Não é possível um processo de impeachment sem respeito aos ritos”, disse. Para o advogado Roberto Podval, que defende Witzel no processo criminal, a delação de Edmar não ameaça seu cliente. “Se partirmos da premissa de que o secretário vai ser honesto na delação, não preocupa”, diz. “Até agora não foi juntada a documentação que sustenta as acusações e não vimos nada que incrimine o governador”. Há uma ampla investigação em andamento que deve ser definida nas próximas semanas. Se as acusações forem provadas, Witzel merece deixar o governo e ser preso. Nada mais sórdido do que um gestor público tentar se locupletar em meio a uma pandemia que já matou quase 80 mil brasileiros.
Aniquilação política
Politicamente, Witzel está aniquilado. Se depender dos prognósticos atuais, sua carreira política, que tinha pretensões presidenciais, se revelará um voo de galinha. A abertura do processo de impeachment foi aprovada por 69 dos 70 deputados. A bancada governista se dissolveu na sua briga com o presidente Jair Bolsonaro. E só sobrou oposição. Além do mais, seu vice, Cláudio Castro (PSC), está alinhado com o presidente da Alerj, André Ceciliano (PT), fazendo planos para o futuro. O conflito com Bolsonaro explica a presteza da PGR, comandada por Augusto Aras, em investiga-lo. Para completar, desapareceu qualquer apoio popular ao governador. Ele fracassou no combate à pandemia, enganou a população do Rio sobre a água do reservatório do Guandu e incentivou a matança policial nas comunidades locais. “Acho que existem elementos interessantes que dão suporte ao processo de impeachment”, diz a deputada Martha Rocha (PDT), membro da comissão que analisa o afastamento do governador. “Há sinais de que o governo está combalido e sua base se desfez”.