Burocracia e alta taxa de juros dificultam gestão da pequena propriedade rural

Cooperativas de crédito são alternativa para condições mais acessíveis a agricultoras e pecuaristas que se enquadram no Pronaf ou Pronamp

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O presidente Luiz Inácio Lula da Silva disse na última quarta-feira, 27, que o Banco do Brasil emprestou R$ 80 bilhões pelo Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar (Pronaf) este ano, volume que considera os recursos para as safras 2022/23 e 2023/24. Ainda assim, a realidade dos agricultores de pequeno porte é de margens apertadas e dificuldade de acesso à crédito.

No atual Plano Safra, foram destinados para o Pronaf perto de R$ 71,4 bilhões, o que significa R$ 17,8 bilhões a mais do que na temporada anterior. Para esta safra, houve redução das taxas de juros de 5% para 4% ao ano para alimentos como arroz, feijão, ovos, leite, mandioca e tomate. Mesmo diante destas condições, as exigências feitas para o pequeno empresário rural são burocráticas, além do preço pago pelo produto não compensar o custo de produção.

Simoni Tessaro Niehues, agricultora no Sítio Santa Monica, localizado em Serranópolis do Iguaçu, no Paraná, relata que a renovação da Declaração de Aptidão ao Pronaf (DAP) se tornou uma dificuldade, pois uma alteração no ano passado fez mudar os critérios de enquadramento ao prograna. “No ano passado, fizeram com que muitos [agricultores] já não se enquadrassem na DAP, indo para outras linhas de crédito como o Pronamp — Programa Nacional de Apoio ao Médio Produtor Rural , em que os juros são maiores”, ela afirma.

Para ela, a contratação de crédito é necessária para incrementar a infraestrutura, como a instalação de placas solares, ou para o custeio agrícola e o giro de capital, “assim é possível conseguir fazer a venda ou a trava do produto da soja e do milho, visando ter uma venda mais assertiva”, diz Niehues. No entanto, nas atuais condições, a safra 2023/24 já começa com apreensão. “A taxa de juros se torna um problema, as safras estão se tornando atípicas pelo clima e no final a margem do produtor se torna cada vez mais escassa. Se os juros fossem menores, com certeza traria um alívio ao pequeno produtor”, afirma.

Custo por hectare

Mara Motter, gestora da Granja Motter, no município de Três Arroios, no Rio Grande do Sul, diz que o problema maior está na elevação da taxa de seguro agrícola anexada ao crédito de custeio. Na prática, para pegar o recurso é necessário contratar um seguro, a fim de diminuir o risco do financiadores. Só que diante de três anos consecutivos de estiagem, a disponibilidade de valor do seguro por CPF “é cada vez menos condizente com a realidade de custo por hectare”.

“Um agricultor enquadrado no Pronaf ou Pronamp pode ter somente R$ 350.000 de seguro Proagro no ano agrícola. Isso é pouco diante do custo que temos por hectare, sendo que neste valor temos que distribuir às culturas de milho, trigo e soja. Sempre falta e uma parte da lavoura sempre fica sem seguro”, diz. Em relação ao seguro privado, ela afirma que o valor cobrado não justifica a pequena garantia em caso de sinistro.

Além disso, ela comenta que a falta de letramento de digital e facilidade com tecnologias, como aplicativos de banco e exigências como o reconhecimento facial, acabam dificultando a jornada de acesso ao crédito. A produtora gaúcha é jovem, faz parte da sucessão familiar, e conta que praticamente não vai à agência presencialmente e consegue resolver tudo online, como assinatura de contrato pela tela do celular.

“Vejo pequenos produtores com uma dificuldade enorme em entender e fazer isso, pois na maioria das vezes não tem alguém que dê suporte. Disponibilizar treinamento com informações atualizadas para o produtor ou técnicos qualificados com entendimento para auxiliar qual crédito é mais interessante poderiam ser soluções”, diz.

Cooperativas de crédito

Uma das alternativas é acessar a cooperativas de crédito, segundo Mara Motter. Atrelar o pagamento do financiamento ao calendário safra ou obter taxas reduzidas na compra de insumos são condições mais facilitadas pelo cooperativismo.

De acordo com a Organização das Cooperativas do Brasi, o país possui 4.693 cooperativas e o ramo do crédito é o que mais possui associados, são mais de 15,5 milhões de pessoas. Uma parcela relevante deste público utiliza as cooperativas de crédito para financiar a atividade agropecuária.   

“As linhas de crédito nos permitem ter os valores para fazer frente aos custos com insumos das áreas de grãos. Por exemplo, você faz um empréstimo para correção de solo e tendo um solo mais produtivo, pode pagar o investimento feito em somente algumas safras”, diz a produtora gaúcha.

Na última quinta-feira, 28, o Conselho Monetário Nacional (CMN) autorizou a concessão de crédito do Plano Safra 2023/24 para cooperativas agropecuárias, cujos cooperados sejam formados, no mínimo, por 60% de beneficiários do Pronaf, portadores da DAP ou Cadastro Nacional da Agricultura Familiar (CAF).

Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura (Contag)  com 4 mil sindicatos e 27 federações  estima que cerca de 15 milhões de pessoas constituam renda por meio da agricultura familiar, algo em torno de 4 milhões de propriedades administradas por produtores familiares.

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