Celso de Mello rebate deputados que pediram seu impeachment
Ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) há mais tempo no cargo, 30 anos, Celso de Mello afirmou ao jornal O Estado de S. Paulo enxergar “fanatismo, obscurantismo, fundamentalismo e o caráter profundamente retrógrado” entre deputados federais que pediram o impeachment dele próprio e de outros três magistrados do tribunal por terem votado para equiparar homofobia ao crime de racismo.
Conforme o jornal mostrou nesta quarta-feira, o número de pedidos de impeachment contra ministros do Supremo apresentados ao Senado em 2019 já superou o recorde anual – são 14, cinco a mais do que em 2018. O principal alvo neste ano é o presidente da Corte, Dias Toffoli, com 7 representações.
Uma dessas representações contra ministros – assinada por 11 deputados, majoritariamente do PSL – é a que pede a destituição de Celso de Mello, Luís Roberto Barroso, Edson Fachin e Alexandre de Moraes, por “conduta incompatível com a dignidade e o decoro do cargo”, apontando que “legislam no lugar dos parlamentares”, “em desacordo com a separação dos poderes”.
Apresentaram o pedido de impeachment os deputados Bia Kicis (PSL/DF), Coronel Tadeu (PSL/SP), Luiz Philippe de Orleans e Bragança (PSL/SP), Caroline de Toni (PSL/SC), Chris Tonietto (PSL/RJ), General Girão (PSL/RN), Heitor Freire (PSL/CE), General Peternelli (PSL/SP), Nelson Barbudo (PSL/MT), Alexandre Frota (PSDB/SP) e pastor Marco Feliciano (PODEMOS/SP), vice-líder do governo. Na época da autoria da petição, em fevereiro, Frota era do PSL.
Celso de Mello definiu o pedido como “esdrúxulo”, sem fundamentação jurídica adequada, e reagiu aos parlamentares. “O comportamento desses denunciantes, que parecem ser apologistas do pensamento único’, resulta de uma visão totalitária e obscurantista que não tolera nem admite posições contrárias à sua distorcida e retrógrada visão de mundo”, afirmou.
Decano do Supremo, o ministro tornou-se o principal porta-voz em defesa da instituição diante de ataques disparados contra ministros do tribunal. Manifestações no último domingo pediram o impeachment do ministro Gilmar Mendes e do ministro Toffoli.
“Eis a que ponto chegaram o fanatismo, o obscurantismo, o fundamentalismo e o caráter profundamente retrógrado de tais denunciantes, considerado o fato de que se revela inacreditável acusar-se um Juiz pelo exercício regular (e legítimo) da atividade jurisdicional.”
Pra a reportagem , o ministro também afirmou que “os integrantes do grupo LGBTI+, como qualquer outra pessoa, nascem iguais em dignidade e direitos e possuem igual capacidade de autodeterminação quanto às suas escolhas pessoais em matéria afetiva e amorosa, especialmente no que concerne à sua vivência homoerótica”.
“Garantir aos integrantes do grupo LGBTI+ a posse da cidadania plena e o integral respeito tanto à sua condição quanto às suas escolhas pessoais pode significar, nestes tempos em que as liberdades fundamentais das pessoas sofrem ataques por parte de mentes sombrias e retrógradas, a diferença essencial entre civilização e barbárie”, concluiu o ministro.
Os 14 pedidos de impeachment contra ministros do Supremo apresentados em 2019 não tiveram sequência dada pelo presidente do Senado, Davi Alcolumbre. Cabe a ele dar início à tramitação ou arquivá-los.
Trâmite
Alcolumbre tem resistido à pressão para pautar os processos e adota um discurso de conciliação para evitar embates com o Supremo. O parlamentar, porém, não chegou a arquivar as petições – o que abre margem para uma mudança de posição no futuro. Questionado pelo Estado, o presidente do Senado classificou os pedidos como “naturais da democracia”. Nunca um ministro do Supremo foi cassado pelos senadores.
Uma vez aberto, um pedido de impeachment deve ser analisado por uma comissão especial de senadores e, em seguida, pelo plenário.
São necessários os votos de 54 dos 81 parlamentares da Casa para cassar um magistrado da Corte Suprema. A legislação determina que o ministro seja afastado de suas funções após a abertura do processo.
Os motivos que justificam os pedidos protocolados neste ano variam. Incluem o controverso inquérito das fake news, aberto por Toffoli e relatado por Alexandre de Moraes para investigar ofensas contra magistrados da Corte, e a decisão do presidente da Corte que paralisou apurações que contavam com dados fiscais e bancários compartilhados com o Ministério Público Federal antes de a justiça autorizar. Metade dos pedidos são pela queda de Toffoli.