Toffoli vota para restringir repasse de dados da Receita ao MP
Presidente do STF vota para proibir Coaf de compartilhar relatórios “por encomenda” do MP sem autorização da Justiça. Julgamento, que será retomado, definirá o futuro de investigação contra o senador Flávio Bolsonaro.
O presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Dias Toffoli, votou nesta quarta-feira (20/11) a favor da restrição do compartilhamento de relatórios financeiros e fiscais de órgãos de controle – como a Unidade de Inteligência Financeira (UIF), o antigo Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf), e da Receita Federal – com o Ministério Público e a polícia sem autorização prévia da Justiça.
De acordo com o ministro, se nesses relatórios – tecnicamente chamados de representação fiscal para fins penais – constarem extratos de imposto de renda ou mesmo detalhes de movimentação bancária, é necessário que haja o aval da Justiça para que o Ministério Público ou as polícias Federal ou Civil nos Estados tenham acesso.
As informações financeiras são usadas pelo Ministério Público e pela polícia para investigar casos de corrupção, lavagem de dinheiro, tráfico de drogas e movimentações financeiras de organizações criminosas. Na sessão desta quarta-feira, somente o presidente, que é relator do caso, proferiu seu voto. O julgamento será retomado nesta quinta-feira para a manifestação de mais dez ministros.
No entendimento de Toffoli, o Ministério Público não pode requisitar à UIF relatórios de inteligência financeira (RIFs) “por encomenda”, sem que nunca tenha recebido um alerta dos órgãos de controle e para verificar se “tem algo contra fulano”. Da mesma forma, a Receita não pode repassar extratos bancários e declarações de imposto de renda aos procuradores sem decisão judicial autorizando a quebra de sigilo fiscal.
“Não pode haver RIF por encomenda contra cidadãos sem qualquer investigação criminal pré-existente ou se não houve alerta anterior emitido de ofício [espontâneo] pela UIF, com fundamento na análise de informações de inteligência contida nas suas bases de dados”, afirmou Toffoli.
Investigação contra Flávio Bolsonaro por “rachadinha”
O presidente do STF buscou descolar o debate do caso do senador Flávio Bolsonaro, filho do presidente Jair Bolsonaro. O senador é investigado pelo Ministério Público do Rio sob a suspeita de ter desviado parte dos salários de servidores do seu antigo gabinete na Assembleia Legislativa, numa prática conhecida como “rachadinha”.
Em julho, seguindo uma decisão de Toffoli relacionada ao compartilhamento de dados de órgãos de controle, a investigação foi paralisada. De acordo com o voto do ministro, a UIF, antigo Coaf, não poderá mais fazer RIFs “por encomenda” do Ministério Público ou da polícia.
Já a Receita Federal pode continuar compartilhando suas representações fiscais para fins penais (RFFPs) com procuradores, mas estes precisam comunicar à Justiça a abertura de procedimento investigatório assim que recebam as informações.
O julgamento no STF trata de um recurso extraordinário que começou com um caso específico de um posto de gasolina, no interior de São Paulo, que teria sonegado impostos. Este caso específico – em que houve repasse de dados da Receita Federal para o Ministério Público – servirá para que o tribunal discuta a tese, de modo genérico e com impacto em todos os processos semelhantes no país.
Na manhã desta quarta-feira, o procurador-geral da República, Augusto Aras, defendeu, em sustentação oral, o compartilhamento direto dos dados com o Ministério Público Federal, sem a necessidade de crivo judicial.
Aras afirmou que o procedimento é crucial no combate a crimes como corrupção, lavagem de dinheiro e financiamento ao terrorismo, sendo observado em 184 países do mundo, e que a restrição de tal comunicação direta pode ser prejudicial à reputação do Brasil na comunidade internacional.
“Corremos o grave risco de o Brasil vir a ser considerado tecnicamente um paraíso fiscal, mácula excessivamente nociva a um país que necessita retomar o curso do crescimento econômico e estabelecer o bem-estar social”, disse o procurador-geral da República.
Por outro lado, o advogado e jurista Gustavo Badaró, que representa o Instituto Brasileiro de Ciências Criminais (IBCCrim) na condição de interessado na causa, defendeu maior restrição na disponibilização dos dados, de modo a resguardar a privacidade e a intimidade dos indivíduos. Para ele, por ser o órgão capaz de denunciar pessoas, o MP somente poderia ter acesso a tais informações sensíveis sob a supervisão de um juiz, o que impediria abusos, argumentou.
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