Emissão de dívida no exterior ganha tração, mas custo segue maior que no Brasil
Liquidez e prazos de vencimento alongados no mercado externo têm atraído empresas brasileiras, dizem especialistas
A captação de recursos no exterior via emissão de bonds voltou a ganhar tração nas últimas semanas diante da falta de liquidez no mercado local. Embora as operações internacionais possuam um custo mais elevado, os prazos de vencimento e a possibilidade de cheques maiores começam a chamar a atenção das empresas.
“O investidor estrangeiro está voltando a ganhar conforto para investir em companhias brasileiras. Nas últimas quatro semanas, temos visto uma demanda crescente das empresas por financiamentos no exterior, seja por captação privada ou emissão pública”, aponta o advogado Rodrigo Carvalho, sócio do Winston & Strawn, especializado em operações nos Estados Unidos.
A primeira grande emissão ocorreu ainda fevereiro, quando a Braskem (BRKM5) levantou US$ 1 bilhão via bonds, o que chamou a atenção de outros players de mercado, tanto pela quantia envolvida como pelo excesso de demanda pelo papel.
No entanto, a crise bancária internacional, que envolveu as quebras de Silicon Valley Bank (SVB) e Signature Bank e o salvamento do Credit Suisse em uma fusão com UBS, fez as transações entrarem em compasso de espera em março, conforme noticiou o InfoMoney.
O sinal de retomada começou a ser visto neste mês. No último dia 5, o Tesouro Nacional emitiu US$ 2,25 bilhões no exterior, apontando que havia um “bom momento do mercado” que viabilizou a primeira operação soberana do Brasil desde junho de 2021. A agência Reuters apontou uma demanda total de US$ 7,7 bilhões, bem acima do book. Os títulos terão vencimento de 10 anos, com taxa de 6,15% ao ano e prêmio de 2,85 pontos percentuais sobre os papéis do tesouro americano de referência.
Uma semana após a captação soberana, que foi um importante referencial para as operações seguintes, o Banco do Brasil (BBAS3) levantou na última terça-feira (18) US$ 750 milhões em sustainability bond, que são títulos de dívida vinculados a projetos com finalidades sustentáveis. Os papéis terão sete anos de vencimento, com juros de 6,25% ao ano e spread de 3,01 pontos sobre o US Treasury de 2030.
“Diversas variáveis de mercado deram condições para captação de dívida no mercado externo nas últimas semanas. Dentre elas estão o ‘fechamento’ do US Treasury de 10 anos em cerca de 0,5 pontos desde o final de fevereiro – recuando de 4,0% para 3,5%”, escreveram os analistas Altair Pereira, André Sonnervig e Caio Lombardi, em relatório divulgado pelo Bradesco BBI na última semana.
“Outro motivo está nas dificuldades de as empresas acessarem investidores institucionais para captação via debêntures mais longas em razão dos contínuos saques dos fundos de crédito no mercado local”, prosseguiram os analistas.
Tendência de ‘dolarização’
Para Rodrigo Carvalho, sócio do Winston & Strawn e que já chefiou a assessoria jurídica do banco de investimento do Bank of America no Brasil, os movimentos recentes sugerem uma nova onda de “dolarização” das dívidas da empresa.
Se durante o ciclo de alta liquidez e juros baixos da pandemia muitas empresas conseguiram recomprar bonds, seja por ter se capitalizado via equity ou pela emissão de debêntures no Brasil, a tendência agora será cada vez mais a busca pelas emissões externas.
“O mercado de crédito americano, por exemplo, é mais maduro e consegue oferecer prazos e cheques maiores para as companhias neste momento de aperto, especialmente para aquelas empresas com receita em dólar – o que favorece um ‘hedge natural’ – ou as que possuem receita recorrente e reajustada pela inflação”, diz.
Carvalho aponta que empresas de energia e infraestrutura começam a buscar transações tanto para financiamento em bancos americanos como para emissão bonds. “Nas últimas semanas, atuamos em operações que movimentaram pelo menos US$ 800 milhões”, afirma.
Para o advogado, a necessidade de capital de giro e estabilização dos passivos pelas empresas em um momento que o financiador interno oferece prazos curtos e prêmios maiores acaba tornando a captação no exterior mais atrativa.
“Os CFOs naturalmente sempre buscam formas de estabilizar sua estrutura de capital. Nominalmente, os juros americanos estão mais baixos que ficar exposto em real com juros altos, tudo vai depender do custo da proteção cambial”, reforça Carvalho.
Custo ainda é alto
De acordo com levantamento do Bradesco BBI, ao se comparar a operação do Banco do Brasil com uma emissão de debêntures feita recentemente pela ISA Cteep (TRPL4), que levantou R$ 550 milhões ao caixa, o custo médio da transação internacional foi mais alto – os analistas apontam que esta foi a única emissão de prazo e qualidade de crédito similares que pode servir de comparação.
Ao fazer o swap da dívida do BB em juros americanos e dólar para real e CDI, a emissão do bond saiu mais cara. A taxa do bond de 7 anos do Banco do Brasil “swapada” ficou em CDI + 2,4%, enquanto a Cteep fez uma emissão a CDI + 1,5% com vencimento em sete anos.
“O resultado foi, que mesmo diante da melhora das condições para captações no exterior, a taxa emitida pelo Banco do Brasil ‘swapada’ para CDI continua acima das taxas em CDI de debêntures emitidas por empresas de boa qualidade de crédito no mercado local, desconsiderando o custo dos derivativos”, conclui o BBI.