Em artigo, André Lara Resende questiona política de juros altos do Banco Central
“Protestar contra os gastos autorizados pela PEC e simultaneamente defender a manutenção das absurdas taxas de juros fixadas pelo BC desafia a lógica”, diz
Cotado para ser integrante da equipe econômica do governo, notoriamente para o ministério do Planejamento, o economista André Lara Resende teceu críticas à política monetária vigente em artigo publicado nesta segunda-feira (26) no jornal Valor Econômico.
A estratégia comumente adotada no mundo para o combate à inflação, aponta ele, teria como efeito prejudicar as classes mais baixas e favorecer os “rentistas”.
Isso fica ilustrado com a resistência do mercado financeiro à PEC da Gastança. “O gasto primário, para atender necessidades básicas da população carente, seria inflacionário, mas o gasto com o serviço da dívida, com o bolsa rentistas, não“, afirma.
De acordo com ele, a elevação da taxa básica pelo Banco Central nos últimos três anos custou ao Tesouro 1,75% do PIB em 2021 e 3,65% do PIB em 2022. Desde o início de 2021, o Banco Central elevou a taxa básica de juros de 2,75% para 13,75% hoje.
A “PEC da Transição”, que autorizou gastos acima do teto num valor de até R$ 169 bilhões, representa algo próximo de 2,2% do PIB.
“É um pouco superior ao custo adicional da dívida, devido à elevação da taxa básica pelo Banco Central, em 2021 e bem inferior ao custo adicional da dívida, pelo mesmo motivo, em 2022. Sem entrar no mérito das despesas autorizadas, deve-se lembrar que grande parte delas é para garantir o valor das transferências em R$ 600 e o auxílio de R$ 150 a famílias com crianças até seis anos de idade, o programa assistencialista que tem apoio praticamente unânime no país”, aponta.
Para Resende, o alto patamar dos juros reais brasileiros não tem auxiliado o combate à inflação e “ao contrário do que se poderia prever, a diferença entre a inflação do grupo dos altistas (que subiram mais significativamente as taxas nos últimos meses) e a dos demais países parece ter aumentado, não diminuído“, defende.
O economista avalia que a inflação de hoje, provavelmente em toda parte, mas com certeza no Brasil, não é de demanda. “É fruto da desorganização da produção durante a pandemia e da alta dos preços de energia devido ao conflito na Ucrânia. Por isso, a inflação aqui cedeu com a redução dos impostos sobre os derivados de petróleo, não por causa da alta dos juros básicos. Esta é uma afirmação passível de ser contestada, dado que não há como comprovar causalidade, mas o Banco Central começou a subir os juros há dois anos e a inflação só deu sinais de arrefecimento com a desoneração fiscal de 2022”, afirma.
Ele cita uma matéria do “The Economist”, que mostra grupo de países que mais agressivamente subiram as taxas de juros depois da pandemia, Brasil, Chile, Hungria, Nova Zelândia, Noruega, Coreia do Sul, Peru e Polônia, tiveram um desaquecimento da economia em relação aos demais países. Já a inflação média continuou “teimosamente alta”, elevando-se 3.5 pontos de percentagem desde março de 2022.
Ele avalia que as despesas públicas, sejam elas primárias (elevação dos programas sociais) ou vinculadas ao serviço da dívida (via alta de juros), expandem a demanda agregada e podem vir a pressionar a inflação. “Pode-se compreender que ambos fossem motivo de crítica, mas protestar contra os gastos autorizados pela PEC e simultaneamente defender a manutenção das absurdas taxas de juros fixadas pelo Banco Central desafia a lógica”, apontou.