Distorção na estimativa do IPCA poderá aumentar espaço para gastos em 2023, diz Caio Megale, da XP
Segundo economista, se indicador não for atualizado, valor limite para as despesas do governo ficará defasado, permitindo gastos extras de R$ 24 bilhões
O espaço para aumento de despesas do governo eleito em 2023 poderá superar em mais R$ 24 bilhões o valor que vem sendo negociado na Proposta de Emenda à Constituição (PEC) da Transição, de cerca de R$ 200 bilhões. O cálculo é do economista-chefe da XP, Caio Megale.
Isso porque a estimativa de inflação utilizada no Orçamento do ano que vem é maior do que a taxa esperada atualmente. Se o indicador não for atualizado, o valor do limite para as despesas do governo ficará defasado, permitindo uma gordura extra de gastos da ordem de R$ 24 bilhões.
O teto de gastos é uma regra que limita o crescimento das despesas do governo a cada ano à variação da inflação oficial, o IPCA. Porém, enquanto o projeto do Orçamento de 2023 foi feito com uma previsão de 7,2% para o IPCA deste ano, a taxa efetivamente esperada pelo mercado tem oscilado entre 5,8% e 6%.
Essa defasagem aumenta, na prática, o valor do teto de gastos de 2023. Sem a correção do índice, o espaço para gastar em 2023 se soma à licença de R$ 198 bilhões que o anteprojeto da PEC, encaminhado pelo PT, abre no Orçamento para novas despesas. Megale afirma que o Congresso deveria fazer o ajuste da inflação já na votação da lei orçamentária, prevista para dezembro.
Mudança de regra
O problema da correção do teto de gastos surgiu quando o governo Bolsonaro e o Congresso mudaram a forma de correção da regra fiscal na chamada PEC dos Precatórios para gastar mais em 2022, ano de eleições. O teto era corrigido pela inflação de 12 meses até junho. Com a PEC dos Precatórios, a regra passou a ser a inflação do ano cheio. Como o Orçamento costuma ser votado no ano anterior, o resultado da inflação anual ainda não está fechado.
Para ajustar essa defasagem, o Ministério da Economia é obrigado a enviar à Comissão Mista de Orçamento (CMO) mensalmente as novas estimativas.
O Estadão apurou que o relator do Orçamento, senador Marcelo Castro (MDB-PI), não é obrigado a fazer o ajuste agora. Consultores do Congresso ouvidos pela reportagem afirmam que há dúvida se o ajuste deverá ser feito ao longo do exercício ou só no ano seguinte.
Para os negociadores do governo de transição, no entanto, o texto é claro ao dizer que ajuste é feito no ano seguinte ao exercício do Orçamento. Isso significa que, em 2024, o limite do teto de gastos ficaria R$ 24 bilhões menor, comprimindo novamente o espaço das despesas depois da alta prevista para 2023. Esse seria mais um incentivo, na avaliação dos consultores, para o governo não postergar a revisão do arcabouço fiscal.
Megale, no entanto, não vê dessa forma. Ele alerta, inclusive, que poderá estar havendo dupla contagem. É que, com a inflação esperada mais baixa, o governo eleito não precisaria reservar na conta da PEC um espaço para garantir um ganho real para o valor do salário mínimo, como negocia agora.
No seu entendimento, os recursos previstos no projeto de Orçamento já seriam suficientes para dar aumento real do salário mínimo, que é atrelado ao INPC. A reserva feita na PEC para dar o ganho do mínimo é de R$ 6,4 bilhões. “A nossa suspeita é de que não vão incorporar na última hora no Orçamento”, diz Megale. Segundo ele, a Constituição deixa uma brecha para que o IPCA de dezembro possa ser estimado pelo Congresso. “A minha impressão é de que podem estimar um IPCA alto”, completa.