Agronegócio está de olho em políticas de Lula para Amazônia e alimentos
Primeiros sinais sugerem que novo governo criará oportunidades e ventos contrários para os agricultores brasileiros.
Produtores, traders e consumidores de todo o mundo estão observando os primeiros passos de Luiz Inácio Lula da Silva nas políticas para o setor agro e meio ambiente.
Isso porque, como o próximo presidente do Brasil, Lula e suas decisões irão repercutir nas cadeias de abastecimento de alimentos do mundo. O Brasil é o maior exportador mundial de soja. Fornece mais carne bovina para o mundo do que qualquer outro país. E é o segundo maior exportador global de milho.
Os mercados agrícolas abalados pelo clima extremo e a invasão da Ucrânia pela Rússia precisam dos produtos do Brasil mais do que nunca.
Os primeiros sinais sugerem que um governo Lula criará oportunidades e ventos contrários para os agricultores brasileiros. Aqui está um breve resumo sobre suas prováveis ações e como elas podem afetar os mercados agrícolas:
Desmatamento da Amazônia
Lula disse que planeja aumentar a fiscalização sobre o corte raso ilegal para reverter o ritmo do desmatamento sob o atual presidente Jair Bolsonaro.
“Vamos provar mais uma vez que é possível gerar riqueza sem destruir o meio ambiente”, disse Lula em seu primeiro discurso após as eleições, acrescentando que trabalhará pelo “desmatamento zero” da Amazônia.
Embora isso possa prejudicar um pequeno grupo de agricultores que é favorável ao desmatamento, isso aumenta a reputação dos exportadores de soja e frigoríficos do país – que estão entre os maiores do mundo – competindo por clientes mais conscientes do meio ambiente.
O desmatamento aumentou constantemente sob Bolsonaro. A agricultura e pecuária foram responsáveis por 97% do total da área desmatada no Brasil no ano passado, segundo o MapBiomas, iniciativa que fornece mapas e análises de cobertura do solo. Ainda assim, menos de 1% de todas as propriedades registradas representaram 76% do total de áreas desmatadas.
Uma minoria de agricultores está envolvida, mas se eles tiverem espaço para agir, “podem deteriorar a reputação de todo o setor do agronegócio”, disse Tasso Azevedo, coordenador geral do MapBiomas.
Os agricultores brasileiros estão plantando um recorde de 77 milhões de hectares nesta temporada. A área mais que dobrou nas últimas quatro décadas e meia, enquanto a produção aumentou 565% no mesmo período devido a ganhos de produtividade.
Uma repressão ao desmatamento pode estimular o uso de áreas de pasto degradado para cultivo agrícola. O país tem cerca de 90 milhões de hectares que podem ser melhor aproveitados, segundo a Embrapa, agência estatal de pesquisa agrícola.
“O Brasil tem a grande vantagem de ter grandes pastagens que atualmente são mal utilizadas e podem ser transformadas em áreas de grãos ou fazendas que integram agricultura e pecuária”, disse Ana Luiza Lodi, analista da StoneX.
Isso já está acontecendo em parte da fazenda de Mauro Lucio Costa em Paragominas, cidade do norte do Pará. Costa arrendou 40% de seus 880 hectares para um produtor de soja, mantendo seu rebanho de 2.000 cabeças na área restante.
Comércio
No comércio, os agricultores temem que Lula imponha taxas de exportação para aumentar a oferta local de alimentos, medida adotada pela vizinha Argentina. Durante a campanha, Lula disse aos apoiadores que “discutiria” a política brasileira de exportação de carne bovina para reduzir os preços locais. Fazer com que mais brasileiros voltem a comer carne bovina foi uma das promessas mais populares de Lula.
O futuro da política fiscal do Brasil pode afetar a moeda e a atratividade das exportações agrícolas como consequência, segundo José Carlos Hausknecht, sócio da consultoria MB Agro. Embora Lula possa atrair mais investidores e capitais estrangeiros, que podem valorizar a moeda local, o aumento dos gastos públicos pode levar a uma desvalorização do real, disse ele.
No curto prazo, o principal benefício de controles ambientais mais rígidos seria um relacionamento mais tranquilo com a União Europeia, abrindo caminho para o avanço do acordo comercial UE-Mercosul. O acordo pode beneficiar a indústria de biocombustíveis do Brasil removendo as tarifas atuais da UE sobre as importações de etanol, disse Tarcilo Rodrigues, diretor da corretora Bioagencia.
A China compra cerca de 70% das exportações de soja do Brasil e cerca de metade dos embarques de carne bovina, e recentemente autorizou embarques brasileiros de milho e farelo de soja.
Embora a política ambiental de Bolsonaro não tenha prejudicado as exportações agrícolas do Brasil até agora – a receita deve atingir um recorde este ano –, mais cedo ou mais tarde, importadores, incluindo a China, exigirão um compromisso para combater o desmatamento. “Esta não é apenas uma agenda europeia”, disse Marcos Jank, consultor e professor global de agronegócios do Insper.