Reality shows podem nos ensinar sobre nós mesmos, diz livro
Para socióloga americana, que estuda os impactos sociais desses programas, os realities ajudam as pessoas a aprenderem mais sobre si mesmas e sua cultura
De longe, reality shows como “Jersey Shore” e a franquia “Real Housewives” não parecem programas dignos de estudo sociológico.
Mas não é isso que acredita a escritora e socióloga Danielle Lindemann.
Autora de livros sobre casais viajantes e dominatrixes, a americana cresceu assistindo à reality shows e se especializou no assunto – hoje, ministra um seminário sobre o tema na Lehigh University, nos Estados Unidos, onde é professora associada.
“Os realities meio que me seguiram por toda a vida”, disse Danielle à CNN durante o lançamento de seu livro, “True Story: What Reality TV Says About Us”. “Especialmente nos momentos mais difíceis, sempre recorro à eles. E parece que muitas pessoas fazem o mesmo.”
Apesar de tanta audiência, quando se trata de pesquisas sobre os impactos culturais dos reality shows, os resultados são escassos. Então, Danielle decidiu assumir o tema.
Sua última análise, que resultou no livro “True Story…”, à venda nos Estados Unidos, pede aos leitores que vejam seus programas favoritos através de uma lente analítica.
Séries como “Survivor” e “The Bachelor” não são apenas formas de entretenimento escapista ou janelas através das quais se admiram estranhos em situações extremas, diz ela: “Os realities são um espelho de diversão para os espectadores através do qual eles podem aprender mais sobre si mesmos e sua cultura”.
“Reality show é uma espécie de vida real exagerada”, diz. “Mas muitas vezes é olhando para essas caricaturas e traçando seus contornos que chegamos a uma maior compreensão de nós mesmos.”
Em um ponto da introdução do livro, Danielle descreve o reality show como “um elemento de nossa cultura em forma de drag”, fazendo referência à teoria da filósofa Judith Butler de que “a arte de drag elucida as maneiras pelas quais realizamos gênero dentro de certos limites”. A mesma teoria pode ser aplicada às maneiras como consideramos raça, sexualidade, classe e nós mesmos, escreve ela.
Para explicar melhor essas ideias, Danielle se baseia em personagens e momentos familiares para espectadores de reality shows. Com a estrela de “Real Housewives of New York City”, Luann de Lesseps e sua evolução de “condessa” arrogante para performer de cabaré divorciada e ligeiramente autoconsciente, podemos perceber que “não existe um eu ‘autêntico’”, mas os eus que criamos parcialmente com base nas percepções dos outros.
Ambos os concorrentes em “The Bachelor” e “RuPaul’s”, escreve ela, interpretam a feminilidade de maneiras exageradas e estereotipadas. E os assuntos abordados em “My Strange Addiction”, do TLC – Danielle conta no livro sobre uma mulher que não conseguia parar de comer almofadas de sofá –, ilustram que “desvio social” (e nossa resposta a ele) é uma construção feita em sociedade.
Um dos argumentos centrais do livro é “como os reality shows nos ensinam com que persistência mantemos nossas ideias sociais e as formas estreitas e rígidas de definir o que é legítimo e saudável”.
Podemos sentir nojo de uma casa perigosa em “Acumuladores” da mesma forma que admiramos a beleza das mulheres em “The Bachelor”, que se vestem com vestidos deslumbrantes e saltos perigosamente altos para conquistar o coração de um homem que acabaram de conhecer.
“De certa forma, esses programas, que são malucos de muitas maneiras – com festeiros batendo os punhos, pessoas que comem sofás, rainhas da beleza infantil – são na verdade o conteúdo menos maluco da TV”, disse ela à CNN.
Se for para o tirar algo do livro, ela espera que os leitores repensem o fato de minimizar o significado do gênero desse programa – principalmente porque um dos últimos empregos que o ex-presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, teve foi o de anfitrião de uma competição de TV.
“Eu acho que há poucas pessoas levando isso a sério”, disse ela. “É fácil olhar para programas como esses como um espetáculo cultural ou um programa de coisas frívolas. Mas, como vimos com a eleição de Trump, não é um espetáculo cultural, é o evento principal.”