Governo pede mais tempo para costurar acordos e votação da PEC dos Precatórios é adiada no Senado

Líder do governo e relator da matéria, o senador Fernando Bezerra Coelho (MDB-PE) disse que um acordo "está próximo de ser compreendido"

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O Senado Federal adiou mais uma vez a votação da PEC dos Precatórios em primeiro turno no plenário, apesar do forte interesse do Palácio do Planalto em dar celeridade à matéria.

Durante a sessão desta quarta-feira (1), em que a casa legislativa se dedicou a aprovar indicações de autoridades para cargos públicos – inclusive de André Mendonça para o Supremo Tribunal Federal (STF) –, o relator da proposta, senador Fernando Bezerra Coelho (MDB-PE), que também é líder do governo, disse que um acordo para a aprovação da matéria “está próximo de ser compreendido”.

Com o avanço das negociações, Bezerra sugeriu que a deliberação da proposta ficasse para a quinta-feira (2), às 9h (horário de Brasília). Neste caso, um dos desafios para o Palácio do Planalto será manter o quórum elevado para não correr riscos de ser derrotado em plenário ou ver alguma destaque indesejado de bancada aprovado pelos congressistas.

 

O governo tem enfrentado maiores resistências durante a tramitação da PEC dos Precatórios no Senado Federal. Por isso, precisou abrir uma frente de negociações – o que tem significado concessões em troca de apoio necessário para a aprovação da matéria.

Por se tratar de Proposta de Emenda à Constituição (PEC), o texto precisa do apoio de 3/5 dos integrantes de cada casa legislativa em dois turnos de votação. Ou seja, no Senado Federal, são pelo menos 49 dos 81 votos.

Pela regra, Câmara e Senado precisam aprovar a mesma versão do texto para que ele seja promulgado e passe a valer. A proposta vai de uma Casa para a outra (o chamado pingue-pongue) até que seja votada sem diferenças de mérito.

O presidente do Senado Federal, Rodrigo Pacheco (DEM-MG), reafirmou que a PEC dos Precatórios tem “absoluto senso de urgência” e acatou a sugestão do relator. Ele anunciou, ainda, que a MP do Auxílio Brasil (MP 1.061/21), de relatoria do senador Roberto Rocha (PSDB-MA), também será apreciada na quinta-feira. O texto foi aprovado pelos deputados na semana passada.

Um grupo de senadores tenta convencer o relator a respeito do fim do subteto para precatórios em 2026. A mudança sofre resistência por parte do Ministério da Economia, que vê o risco aos parâmetros fiscais com eventual rediscussão constitucional em ano eleitoral. O texto resultante dos acordos que sucederam a aprovação da matéria na CCJ ainda não é conhecido.

O que está em jogo?

A PEC dos Precatórios libera espaço de R$ 106,1 bilhões no Orçamento de 2022, conforme cálculos atualizados do Ministério da Economia. O texto cria um subteto para o pagamento de precatórios (que são dívidas judiciais do poder público sem possibilidade de novos recursos), limitando a evolução dessas despesas à regra geral do teto de gastos retroativa a 2016, ano de sua criação.

 

Durante a tramitação na Câmara dos Deputados, também foi alterada a metodologia de cálculo do teto de gastos. Hoje, a regra fiscal permite a atualização dos gastos públicos pela inflação, medida pelo Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), acumulada em 12 meses até junho do ano anterior ao exercício. Pelo texto, o período de aferição passaria para janeiro a dezembro.

A matéria é tida pelo governo como fundamental para viabilizar o pagamento do Auxílio Brasil – novo programa de transferência de renda criado para substituir o Bolsa Família – em versão mais robusta. O benefício começou a ser pago em novembro, em valor médio de R$ 217,18 (aumento de 17,84% em relação ao tíquete médio de R$ 189 pago no programa anterior) a 14,5 milhões de famílias.

O objetivo de Bolsonaro é ampliar o valor do benefício a pelo menos R$ 400,00 para todas as famílias até dezembro de 2022. O número de contemplados também poderá crescer para 20 milhões de famílias, conforme o desenho aprovado pela Câmara dos Deputados na Medida Provisória que institui o novo programa social (texto que precisa ser analisado pelos senadores até 6 de dezembro para não perder validade).

Do lado dos precatórios, o texto limita o pagamento de novas dívidas em determinado exercício a uma correção anual pela inflação do valor pago em 2016 (a versão aprovada pelos deputados impunha limitação para a expedição dos precatórios pelo Poder Judiciário, mas esse ponto foi modificado durante a tramitação no Senado Federal).

Na prática, é a mesma lógica do teto de gastos, desta vez usada para restringir o pagamento de dívidas que a própria Justiça determina que o poder público deve pagar.

O limite corresponderá, em cada exercício, ao limite estabelecido pela atualização da regra fiscal, reduzido da despesa com o pagamento de requisições de pequeno valor (RPVs), que terão prioridade no pagamento. Integram o grupo peças que não ultrapassem 60 salários mínimos (ou seja, R$ 66 mil).

O texto determina que precatórios que não forem pagos, em razão da restrição de despesas aplicada, tenham prioridade nos exercícios seguintes – o que críticos apontam como risco de “efeito bola de neve”, quando a dívida cresce mais rápido do que a capacidade de pagamento do governo. O cálculo do limite não considera um possível “encontro de contas” entre os entes e atualização monetária ou a quitação por acordo de renúncia de 40% dos valores por parte do detentor dos direitos ao precatório.

A atual versão do texto permite que os credores não contemplados pela quitação em um ano possam optar pelo recebimento dos recursos em parcela única, até o final do exercício seguinte, mediante acordos diretos perante Juízos Auxiliares de Conciliação de Pagamento de Condenações Judiciais contra a Fazenda Pública Federal, desde que com renúncia de 40% dos valores.

 

A norma seria regulamentada pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ), mas é vista por críticos com elevado risco de judicialização no futuro, já que os precatórios são compromissos financeiros reconhecidos pelo Poder Judiciário e que devem ser honrados pelo governo federal.

Os precatórios pagos com desconto não serão incluídos no limite anual dessa despesa no orçamento e ficarão de fora do teto de gastos. Essas exclusões se aplicam ainda àqueles precatórios para os quais a Constituição determina o parcelamento automático se seu valor for maior que 15% do total previsto para essa despesa no orçamento.

De igual forma, o texto introduz a possibilidade de o ente devedor utilizar empréstimos como instrumento específico de liquidação de precatórios, mediante acordo direto com os credores.

A proposta também torna possível a utilização dos precatórios para:

I) Quitação de débitos parcelados ou débitos inscritos em dívida ativa do ente devedor, inclusive em transação resolutiva de litígio, e, subsidiariamente, débitos com a administração autárquica e fundacional do mesmo ente;

II) Compra de imóveis públicos de propriedade do mesmo ente;

III) Pagamento de outorga de delegações de serviços públicos e demais espécies de concessão negocial promovidas pelo mesmo ente;

IV) Aquisição, inclusive minoritária, de participação societária do respectivo ente federado;

 

V) Compra de direitos do respectivo ente federado, inclusive, no caso da União, da antecipação de valores a serem recebidos a título do excedente em óleo em contratos de partilha de petróleo.

Nestes casos, as despesas também ficarão de fora do teto e do limite os precatórios. A versão original encaminhada pela equipe econômica do governo federal apenas previa as situações de compra de imóveis públicos ou aquisição de participação societária, mas os demais pontos foram incluídos durante a tramitação da matéria na Câmara dos Deputados.

A atual versão do texto mantém a possibilidade do chamado “encontro de contas” entre a União e os entes federativos, inclusive com a possibilidade de dedução dos valores eventualmente devidos por estados de recursos estipulados para repasse pelos fundos de participação, tal qual previa a proposta original.

Estão previstos quatro tipos de compensação, fora do limite anual da regra fiscal, de despesas com precatórios usados pela União e demais entes federativos:

I) Contratos de refinanciamento;

II) Quitação de garantia executada se concedida a outro ente federativo;

III) Parcelamentos de tributos ou contribuições sociais;

IV) Obrigações decorrentes do descumprimento de prestação de contas ou de desvio de recursos.

Essas compensações são direcionadas principalmente a estados e municípios que têm dívidas refinanciadas perante a União e participam de programas de recuperação fiscal cujos contratos exigem a observância do teto de gastos. No entanto, somente podem ocorrer se for aceito por ambas as partes.

Quando incidirem sobre parcelas a vencer, haverá redução uniforme no valor de cada parcela, mantida a duração original do respectivo contrato ou parcelamento.

Adicionalmente, o texto especifica que os contratos de parcelamentos ou renegociações de débitos firmados pela União com os entes federativos deverão conter cláusulas para autorizar que os valores devidos serão deduzidos dos repasses aos fundos de participação (FPM ou FPE) ou dos precatórios federais a pagar.

Entre as contrapartidas exigidas, o substitutivo lista medidas de ajuste fiscal, como a adoção de regras de elegibilidade, cálculo e reajustamento dos benefícios que contemplem regras assemelhadas às aplicáveis aos servidores públicos do RPPS da União, a adequação da alíquota de contribuição devida pelos servidores e a instituição do regime de previdência complementar.

O texto que veio da Câmara dos Deputados também estabelece que os precatórios para o pagamento de dívidas da União relativas ao antigo Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental e de Valorização do Magistério (Fundef) deverão ser quitados com prioridade em três anos: 40% no primeiro ano e 30% em cada um dos dois anos seguintes. Essa prioridade não valerá apenas contra os pagamentos para idosos, pessoas com deficiência e portadores de doença grave.

De acordo com a Consultoria de Orçamento da Câmara, do total de precatórios previstos para pagamento em 2022, 26% (R$ 16,2 bilhões) se referem a causas ganhas por quatro estados (Bahia, Ceará, Pernambuco e Amazonas) contra a União relativas a cálculos do antigo Fundef. Parte dos recursos deve custear abonos a professores, conforme disciplina o PL 10.880/21, aprovado também nesta terça-feira pela Câmara.

Quanto ao credor privado, a proposta tenta resolver um ponto considerado inconstitucional nas versões anteriores de compensação dos precatórios com dívidas tributárias perante o Fisco. Decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) deu sobrevida até 2020 à norma considerada inconstitucional que previa a compensação de ofício pela Fazenda Pública.

O substitutivo propõe que o governo deverá depositar o valor equivalente aos débitos inscritos em dívida ativa na conta do juízo em que está a ação de cobrança do Fisco contra o credor do precatório. Dessa forma, não haveria compensação automática e o juiz decidiria sobre isso conforme procedimento definido em lei própria.

Outra mudança na regra geral de pagamento de precatórios é o uso da taxa básica de juros, a Selic (atualmente em 7,75% ao ano em tendência de alta), para atualizar os valores de qualquer tipo de precatório a título de atualização monetária, remuneração do capital e compensação de mora.

Quando do julgamento de uma Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI), o Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu, em 2015, que a Selic poderia ser usada apenas em precatórios tributários. Os demais deveriam ser corrigidos pelo Índice de Preços ao Consumidor Amplo Especial (IPCA-E), que repõe a inflação.

À época, a Corte considerou que o índice da poupança imposto pela Emenda Constitucional 62/09 não mantinha o poder de compra do dinheiro ganho na causa. Como juros de mora, impôs 0,5% ao mês calculados até o momento da expedição do precatório e incidentes também a partir do momento em que houver atraso na quitação. Em 2021, por exemplo, o IPCA-E acumulado está em 7% (até setembro).

Alterações no Senado

Diante das resistências de senadores ao texto vindo da Câmara dos Deputados, o relator Fernando Bezerra Coelho (MDB-PE) abriu uma frente de negociações para modificar o texto em busca do apoio necessário.

Antes da votação nesta terça-feira, o parlamentar apresentou uma complementação de voto, com outros ajustes além dos que haviam sido acordados com os senadores na semana passada.

Veja os principais pontos incluídos:

1) Segurança no Pagamento das Parcelas do Fundeb
Determinação clara de prazos para o pagamento de precatórios relativos ao antigo Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental e Valorização do Magistério (Fundef). Desta forma, 40% seriam pagos até 30 de abril, 30% até 31 de agosto e o restante até 31 de dezembro. Assim, fica assegurado repasse regular dos recursos ao longo do ano, eliminando preocupação de governadores de que o governo deixasse para pagar apenas no fim do exercício.

2) Fundef do teto de gastos
Retirada de despesas com o Fundef tanto do teto de gastos quanto do limite de pagamentos de precatórios instituído pela própria proposta. Mas a sistemática de pagamentos parcelados em três anos está mantida. Em termos fiscais, a mudança não abre mais espaço para gastos em 2022, já que os valores previstos para pagamentos com precatórios continuarão totalmente ocupados – neste caso, com a substituição das dívidas do Fundef por outras.

3) Pagamento de Bônus com Recursos dos Precatórios do Fundeb
Inclusão de exigência de que estados e municípios que receberão os precatórios não transformem os recursos em despesas permanentes, que poderiam desequilibrar as contas dos entes a longo prazo. O substitutivo prevê o repasse de, no mínimo, 60% dos recursos aos profissionais do magistério, inclusive aposentados e pensionistas, na forma de abono, vedada a incorporação na remuneração, aposentadoria ou pensão.

4) Formação dos precatórios
Previsão de maior participação do Poder Legislativo na constituição dos precatórios. O texto prevê que, no prazo de um ano a contar da promulgação da emenda constitucional, o Congresso Nacional promoverá, através de Comissão Mista, exame analítico e pericial dos atos, fatos e procedimentos geradores dos precatórios e sentenças judiciais contrárias à Fazenda Pública.

O colegiado atuará em cooperação com o Conselho Nacional de Justiça podendo requisitar informações e documentos de órgãos e entidades da administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios.

Ao final, o parlamento encaminhará suas conclusões aos presidentes do Supremo Tribunal Federal, dos Tribunais Superiores, dos Tribunais Regionais e dos Tribunais de Justiça dos Estados, bem como ao Procurador-Geral da República, para a prática de atos de sua competência.

5) Alocação do Espaço Aberto no Teto
Vinculação explícita de parte do espaço fiscal aberto no Orçamento com a proposta para a ampliação de programas sociais de combate à pobreza e extrema pobreza, bem como a outras despesas obrigatórias ou atreladas à saúde, previdência e assistência social.

6) Auxílio Brasil permanente
Inclusão de dispositivo nos Atos das Disposições Transitórias da Constituição Federal que dispensa a legislação que trata de programa permanente de transferência de renda da observância das limitações legais quanto à criação, à expansão ou ao aperfeiçoamento de ação governamental que acarrete aumento de despesa.

7) Mudança do prazo para inclusão dos precatórios no PLOA
Previsão que o Projeto de Lei de Diretrizes Orçamentárias (PLDO) preveja, em seu anexo de riscos fiscais, o volume de decisões judiciais que pode vir a ser pago no exercício seguinte. O texto estipula a data de 2 de abril para a inclusão, no orçamento das entidades de direito público, da verba necessária ao pagamento dos débitos oriundos de sentenças transitadas em julgado.

8) Direitos adquiridos por terceiros
Inclusão de trecho que explicita que a faculdade reservada ao credor para realizar o chamado “encontro de contas” abrange os créditos próprios, mas também os adquiridos de terceiros. Tal dispositivo coloca o adquirente na condição de credor, o que denota direito de utilização dos valores nas mesmas condições que os credores originais.

9) Limitação para drible às regras fiscais
A inclusão de dispositivo que visa esclarecer que a dispensa de observância das limitações legais para criação, expansão ou aperfeiçoamento de ação governamental que acarrete aumento de despesa só se aplica à Lei e ao Regulamento que instituir o benefício para redução da miséria e pobreza. Isso significa que os instrumentos que criarem o Auxílio Brasil não precisarão atender exigências de compensação de despesas permanentes por aumento de receita ou redução de outra despesa permanente. Por outro lado, alterações posteriores que acarretem em aumento real do benefício (ou seja, acima da inflação) deverão observar restrições legais.

10) Procedimentos com estados
Introdução de artigo para tratamento dos casos de estados que tiverem descumprido o teto de gastos, permitindo que restituam mensalmente à União os valores diferidos até o final do contrato de renegociação, desde que adotem os gatilhos previstos pela própria regra do teto.

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Fonte infomoney
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