Quebra do teto de gastos traz pressão por alta maior da Selic
O presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, contava com uma certa disciplina fiscal de seus colegas no governo. Isso, pelo menos, é o que ele disse repetidamente aos investidores nos últimos meses, enquanto crescia a ansiedade com o novo programa social prometido pelo presidente Jair Bolsonaro.
Na semana passada, as garantias públicas de Campos Neto se chocaram com a dura realidade de Brasília às vésperas das eleições do próximo ano. Bolsonaro, desesperado por aumentar seus índices de aprovação, anunciou um programa social tão grande e amplo que desencadeou fortes perdas nos ativos brasileiros e a renúncia de membros-chave da equipe econômica, inclusive o secretário do Tesouro.
A tensa sucessão de eventos agora pressiona o próprio Campos Neto. Enquanto ele se prepara para começar a reunião de política monetária de dois dias amanhã, operadores do mercado estão olhando para o presidente do BC e demais membros do Copom como a última linha de defesa contra a inflação galopante e a turbulência cambial. Até mesmo o ministro da Economia, Paulo Guedes, deixou claro que o fardo agora recai sobre o banco central, dizendo na sexta-feira que a autoridade monetária terá que correr mais rápido para não ficar atrás da curva.
A especulação está aumentando nos mercados de futuros de que o BC irá aumentar a taxa de juros, hoje em 6,25%, em mais de um ponto percentual na reunião desta semana. Mesmo para um banco central que ganhou a reputação de ser um dos mais hawkish do mundo após cinco altas consecutivas, isso seria um passo ousado. Seria o maior aumento de juros no Brasil em quase duas décadas.
A questão é se, em um país onde tantas coisas que estão fora do controle de Campos Neto estão dando errado, ele consegue conter a maré sozinho. O aumento das taxas de juros pode, por si só, acabar com a febre da inflação e acalmar os investidores?
“Parece muito difícil o BC alcançar a meta sem choque favorável em 2022”, disse Mauricio Oreng, economista sênior do Banco Santander Brasil. Ele prevê que a inflação, agora com uma alta anual de mais de 10%, desacelerará para 4,7% no ano que vem, antes de atingir a meta de 3,25% em 2023. Mas isso desde que as taxas de juros atinjam dois dígitos no final do ciclo. A maioria dos analistas vê a inflação em 4,4% no próximo ano.
O BC já havia se comprometido a seguir elevando a Selic ao ritmo de 1 ponto percentual até que as expectativas de inflação voltassem à meta. Mas, os economistas agora dizem que esse ritmo parece muito brando se o BC for cumprir a promessa de fazer “o que for preciso” para controlar os preços.
“Para manter o compromisso inquestionável com a meta de 2022, o BC precisa surpreender o mercado e acelerar de forma relevante o ritmo de ajuste”, disse Mariana Guarino, gestora de portfólio da Truxt Investimentos, com sede no Rio de Janeiro. Isso pode significar um aumento da taxa em até 2 pontos percentuais na quarta-feira, acrescentou ela.