União não tem preferência para cobrar dívida tributária, decide STF
Maioria da Corte seguiu o voto da ministra Cármen Lúcia, relatora do processo; Toffoli ficou vencido
O plenário do STF (Supremo Tribunal Federal) decidiu nesta 5ª feira (24.jun.2021) que a União não tem preferência em relação a Estados, municípios e Distrito Federal na cobrança de créditos da dívida ativa.
A Corte julgou ação proposta em 2015 pelo governo do DF contra trechos do Código Tributário Nacional e da Lei de Execução Fiscal que estabelecem a preferência da União. No processo, o governo argumenta que a Constituição não permite esse tipo de hierarquia.
A maioria do Tribunal seguiu o voto da ministra Cármen Lúcia, relatora do processo. Segundo ela, no plano internacional a União, enquanto representante do Estado Nacional, é soberana. Já no plano interno, iguala-se aos demais entes federados, sem hierarquia superior.
“O estabelecimento de hierarquia na cobrança judicial de créditos da dívida pública da União aos Estados e esses aos municípios desafina o pacto federativo e as normas constitucionais que resguardam o federalismo brasileiro por subentender que a União teria prevalência e importância maior que os demais entes federados”, afirmou.
Ela também destacou que as leis contestadas foram editadas antes da Constituição de 1988, quando o sistema vigente no Brasil admitia a hierarquia. Eis a íntegra do voto (162 KB).
“Na atual ordem constitucional vigente, rompeu-se com esse entendimento pela adoção do federalismo de cooperação e de equilíbrio pela Constituição da República de 1988, pelo que não se pode ter como válida a distinção, por lei, de distinção e hierarquia entre os entes federados, fora de previsão constitucional e sem especificação de finalidade federativa válida”, prossegue o voto.
CONSTITUIÇÃO DE 1967
Segundo a votar, o ministro Kássio Nunes Marques concordou com a relatora. De acordo com ele, o país adotou, a partir de 1988, um modelo de federalismo cooperativo, enquanto as leis questionadas foram editadas à luz da Constituição de 1967, que privilegiava a União.
“Penso que as normativas em questão – que são leis editadas pela União – , ao diferenciar os créditos dos entes públicos atribuindo ordem de prioridade não apenas rompem com a igualdade existente entre as diferentes esferas federadas, mas também com a consequente autonomia dos entes nacionais, por tolher a capacidade de Estados e municípios satisfazerem seus créditos quando em concorrência com a União”, disse.
Alexandre de Moraes afirmou que a Constituição de 1988 descentralizou o federalismo que havia no Brasil. “O legislador apostou em um real federalismo. A União não é mais que os Estados, que por sua vez não são hierarquicamente superiores aos municípios.”
Além de Nunes Marques e Alexandre de Moraes, seguiram Cármen Lúcia os ministros Edson Fachin, Luís Roberto Barroso, Rosa Weber, Ricardo Lewandowski, Marco Aurélio e Luiz Fux.
Fora os trechos do Código Tributário Nacional e da Lei de Execução Fiscal, o Supremo também derrubou parte da Súmula 563, editada pela própria Corte, que estabelecia a preferência da União na cobrança dos créditos.
DIVERGÊNCIA
O ministro Dias Toffoli abriu divergência. Para ele, a União tem que ter preferência. As normas contestadas, disse, prestigiam a dimensão fiscal do pacto federativo, promovendo equilíbrio econômico entre Estados e municípios. Ele foi seguido parcialmente apenas por Gilmar Mendes.
“O reconhecimento da não recepção dessa norma [pela Constituição] pode resultar no embaraço da satisfação da redução das desigualdades regionais. O critério distintivo presentes nas normas questionadas repousa precisamente no conjunto de atribuições federativas conferidas ao ente central político, não em mera superioridade hierárquica desprovida de fundamento”, afirmou Toffoli.