Floyd Mayweather vs Logan Paul: declínio do boxe continua acelerado

Ex-lutador profissional enfrenta o youtuber neste domingo (6), a partir das 19h, em Miami; especialistas mostram preocupação com futuro do esporte

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É difícil dizer se é pantomima ou uma manobra de marketing astuta quando o irmão do lutador e YouTuber rouba o chapéu do boxeador profissional invicto e eles entram em uma briga acalorada antes da coletiva de imprensa.

Floyd Mayweather contra Logan Paul parece a incompatibilidade final, mas é a última em uma série de lutas de exibição lucrativas com boxeadores não profissionais e parece ser um indicativo da crescente decadência do boxe.

Mayweather vale centenas de milhões de dólares, com um recorde de invencibilidade de 50 lutas profissionais e vários cinturões de títulos mundiais em seu nome. Paul não tem cinturões em seu nome, mas muitas visualizações no YouTube – quase seis bilhões e contando. Sua história nos rings, porém, é curta: ele perdeu sua única luta profissional contra outro YouTuber.

Anteriormente, vimos YouTubers lutarem contra YouTubers; vimos boxeadores lutarem contra estrelas do MMA; vimos até o irmão de Paul, Jake – também um famoso YouTuber – lutar contra um ex-lutador de MMA e um ex-jogador da NBA e vencer nas duas ocasiões.

Mas neste domingo (6), os mundos do boxe profissional e do entretenimento entrarão em conflito no ringue.

Os homens do dinheiro devem estar esfregando as mãos de alegria. Quando Jake Paul roubou o chapéu de Mayweather antes da entrevista coletiva de seu irmão e o par se envolveu em uma confusão, as redes sociais e os meios de comunicação explodiram com vídeos e fotos de Mayweather furioso.

E durante a nova conferência final em Miami Beach antes da luta de domingo, Mayweather enfatizou que Paul está entrando em um terreno desconhecido.

“Há uma diferença entre o boxe do YouTube e o boxe de elite – vocês verão essa diferença”, disse Mayweather à Sky Sports.

“Ele está apostando em sua altura, ele está apostando em seu alcance. Então vamos ver. Eu tenho treinado um pouco, aqui e ali, não todo dia. Mas eu não preciso.”

Para o autor e historiador do boxe Mike Silver, que é fã do esporte desde 1959 e assistiu a grandes nomes como Sonny Liston, Muhammad Ali, Joe Frazier e Sugar Ray Robinson em ação, a ascensão dessas lutas lucrativas sinaliza para ele que o esporte que ele cresceu amando está “morto”.

Muhammad Ali lutou contra o japonês Antonio Inoki em 1976
Foto: Bettmann/Getty Images

“O boxe é um negócio e seu negócio é o show business”, disse Silver, autor de “O Arco do Boxe: A Ascensão e Declínio da Doce Ciência”.

“O boxe é show business. E a única coisa positiva que posso dizer é que essas pessoas ganham dinheiro. Eu sinto que grandes lutadores como Archie Moore, Sugar Ray Robinson e Willie Pep, eles devem estar se revirando em seus túmulos”, afirmou Silver.

“[Os lutadores atuais] ganham mais em uma luta do que aqueles lutadores, grandes lutadores, em toda a sua carreira profissional de boxe. Mas sejamos realistas. Isso não é boxe. O boxe como eu o conhecia está morto”, acrescentou.

Pontos positivos e negativos

As lutas de exibição não são incomuns no boxe. Já houve espetáculos infames. Até o grande Ali lutou contra Antonio Inoki em 1976, evento que Silver lembra como “muito decepcionante”.

Desde que Paul e o YouTuber britânico KSI se enfrentaram na primeira luta de boxe profissional entre YouTubers, esse ramo do jogo de luta cresceu rapidamente.

De acordo com Jake Paul, seu nocaute no primeiro assalto contra o ex-lutador do UFC Ben Askren, em abril, resultou em 1,5 milhão de compras no pay-per-view. E com cada uma custando US$ 50, a luta gerou US$ 75 milhões, embora haja dúvidas sobre esses números.

Silver diz que não inveja ninguém que ganha dinheiro onde pode. No entanto, ele diz que a ideia de Jake Paul – a “Kim Kardashian do boxe”, de acordo com o historiador – atrair tanto de uma luta profissional por ter lutado apenas duas vezes profissionalmente antes é reflexo da atual “cultura lixo” da sociedade de hoje.

Logan Paul enfrenta o YouTuber britânico KSI em confornto no Staples Center
Foto: Jayne Kamin-Oncea – 9.nov.2019/Getty Images

No canto oposto, Michelle Joy Phelps – apresentadora de boxe e fundadora de ‘Behind The Gloves’ – acredita que há pontos positivos que podem ser extraídos dessas lutas.

“O dinheiro está sendo feito em escalas tão grandes e as pessoas sintonizam e a audiência está lá”, disse Phelps à CNN. “Como isso pode significar a morte [do Boxe]? Talvez tenhamos mais política de boxe, o que o torna mais frustrante”, afirmou.

“Não acho que esteja morrendo, mas a política definitivamente complicou as coisas, por isso as pessoas ficam mais agitadas ou irritadas com o boxe. Mas quando acontecem os eventos que elas querem, o mundo inteiro está assistindo.”

Preenchendo uma lacuna

Uma coisa que desiludiu os fãs de boxe nos últimos anos é como se tornou difícil para as organizações e promotores de boxe travar lutas de alto nível.

Existem quatro comissões principais no boxe profissional e 17 categorias de peso. Anteriormente, havia apenas oito classes de peso, mas mais foram adicionadas ao longo dos anos.

Cada comissão coroa seu próprio campeão mundial em uma divisão de peso, às vezes tendo vários campeões ao mesmo tempo. A revista de boxe ‘The Ring’ também coroa seus próprios campeões mundiais.

O vai e vem recente entre Anthony Joshua e Tyson Fury decepcionou muitos, enquanto uma possível luta de Terence Crawford e Errol Spence parece improvável no momento.

Quando Mayweather lutou com Manny Pacquiao em 2015, a ideia da luta já circulava há cinco anos e o fato de demorar tanto para ser acertada fez com que ambos os lutadores já estivessem, sem dúvida, ultrapassados quando finalmente entraram no ringue, diz Silver.

De acordo com Silver, a dificuldade em organizar esses eventos decisivos é porque cada comissão de boxe tem seu próprio campeão, o que significa que cada um reluta em colocar um lutador no ringue contra os melhores oponentes por medo de perder.

E é aí que essas lutas de exibição preenchem um espaço vazio. “Se antigamente o boxe fosse como é hoje, Marvin Hagler provavelmente nunca teria lutado com Tommy Hearns, ou eles lutariam, talvez, depois que ambos estivessem fora de seus auges”, disse Silver, que também escreveu “A noite em que o árbitro revidou” e “Estrelas no ringue: campeões judeus na era de ouro do boxe”.

“Provavelmente nunca teríamos visto Alexis Arguello contra Aaron Pryor. E provavelmente não teríamos visto Sugar Ray Leonard contra Roberto Duran. Essas são lutas que fizeram história do boxe e fazem do boxe ser o que é. Além disso, possivelmente nunca teríamos visto Frazier contra Ali. É a ganância absoluta [que] tomou conta do esporte e desrespeita o torcedor.”

‘Não me diga que isso é boxe’

Ao longo de sua carreira de boxe de quase 20 anos, Mayweather ganhou o apelido de “Dinheiro”. Depois de se aposentar pela segunda vez em 2015, ele lutou e derrotou a estrela do UFC Conor McGregor e o invicto kickboxer Tenshin Nasukawa, ganhando grandes quantias de pagamento.

A luta contra McGregor foi um divisor de águas, pois as pessoas começaram a perceber as grandes somas de dinheiro que esses eventos poderiam arrecadar.

Por aquela luta, Mayweather supostamente ganhou cerca de US$ 275 milhões (R$ 1,38 bilhão), enquanto McGregor levou US$ 85 milhões (R$ 430 milhões), de acordo com a Forbes.

Embora a qualidade do boxe tenha deixado muitos fãs de boxe de longa data se sentindo frustrados, uma das outras críticas por permitir que os inexperientes entrem no ringue é a sua segurança.

“Seu cérebro não foi feito para ser atingido por socos na cabeça”, diz Silver.

Os boxeadores profissionais são treinados ao longo dos anos para mover a cabeça e os pés para evitar golpes pesados na cabeça o máximo possível, então, quando você não tem experiência nisso, nocautes, golpes pesados na cabeça e concussões se tornam mais prevalentes.

“A ideia é acertar o adversário na cabeça”, disse Phelps. “Não é um concurso de tapas no braço. Levar uma pancada na cabeça pode causar uma concussão em qualquer um.

“E quando você não é treinado apropriadamente para mover sua cabeça para evitar socos, a maioria das pessoas apenas fica parada e tudo o que você vê é apenas uma luta desagradável.”

Enquanto a primeira luta Paul-KSI foi amadora e exigiu proteção na cabeça, as lutas que se seguiram foram profissionais, o que significa que tiveram as mesmas condições que os profissionais – sem proteção e em 12 rounds de três minutos cada.

Para a luta deste domingo (6), porém, a Comissão de Boxe do estado da Flórida (FSBC) confirmou à CNN que será considerada uma exibição porque não é sancionada pela entidade. A FSBC também confirmou que não está fornecendo juízes para o evento, mas sim um árbitro. Ambos os lutadores usarão luvas de 12 onças e terão um total de 8 rounds de três minutos.

Esse tipo de luta já resultou em alguns knockdowns no início do round, mais notavelmente no nocaute de Jake Paul no segundo round contra o ex-jogador da NBA Nate Robinson, cujas fotos viralizaram nas redes sociais depois.

Os riscos de segurança de permitir que esses lutadores não treinados entrem no ring tem uma seção de fãs de boxe, que inclui Phelps, questionando se isso é uma boa ideia ou se medidas mais rigorosas deveriam ser adotadas para proteger os lutadores.

E para luta deste domingo (6), Silver acha que há muitos riscos envolvidos quando se trata de deixar os dois se encontrarem no ringue.

“Se Logan Paul, com mais de 90kg… se Mayweather estiver distraído ou algo assim e ele acertar Mayweather na cabeça… há um perigo aí”, disse ele.

“Se [Mayweather] realmente estiver em forma, ele pararia Logan Paul em um round. Não importa se ele está 20kg acima do seu peso; ele ainda está perto o suficiente de seus dias de luta para machucar esse cara. Mesmo pesando 70 kg, ele é um ex-lutador profissional”, completou.

Então, após a rápida ascensão dessas lucrativas lutas de quase-boxe, qual é o poder de permanência, o jogo final?

De acordo com Silver, tudo se resumirá a dinheiro. “Se os fãs ficarem enojados e disserem: ‘Não estamos interessados, não vamos pagar por isso’, então os parâmetros vão mudar. Mas não vejo isso mudando… depende da economia.”

(Texto traduzido; leia o original em inglês)

 

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Fonte cnnbrasil
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