Examinando: quais são as lições da Estônia para as eleições no Brasil
Vídeo mostra como é o sistema de votação remoto da Estônia, que funciona desde 2005, e quais são os desafios de adiar uma eleição por causa de uma pandemia
E se fosse possível votar de dentro da sua própria casa. Sem precisar ir até o seu colégio eleitoral no domingo de eleição. Isso já acontece, mas não é aqui no Brasil. A Estônia tem um sistema remoto de votação desde 2005. Os eleitores votam através de um aplicativo no smartphone.
E apesar de o sistema ter sido desenvolvido há 15 anos, seria uma ótima solução em um ano de eleições em meio a uma pandemia. O pleito no Brasil foi adiado de outubro para novembro, mas o evento ainda é motivo de receios pelo potencial de disseminação do vírus. No Examinando de hoje vamos te mostrar os desafios de adiar uma eleição e quais as lições que a Estônia pode ensinar para o Brasil em um momento como esse.
Nos dias 15 e 29 de novembro, os brasileiros vão às urnas escolher os novos prefeitos e vereadores dos mais de 5 mil e 500 municípios do país. Votar é algo que a maioria da população está acostumada, afinal, o voto é obrigatório e acontece de dois em dois anos. Em uma eleição, escolhemos o presidente, governadores, deputados e senadores. Na outra, decidimos os prefeitos e vereadores.
Mas agora em 2020, as eleições acontecem em meio a uma pandemia. O processo de eleições em si, não será muito diferente do que estamos acostumados, mas a crise global por conta do vírus alterou a data do pleito, que ainda é visto com receio. O medo é a aglomeração de pessoas nos colégios eleitorais. Por conta disso, algumas medidas de segurança foram adotadas, mas será que elas são suficientes?
Após uma longa discussão no Congresso, os parlamentares brasileiros aprovaram o adiamento das eleições municipais de 2020. Mas o processo foi comprido, porque envolvia os mandatos. Vamos supor que as eleições tivessem sido adiadas para 2021. Nesse caso, como ficariam os cargos de vereadores e de prefeitos após o dia 31 de dezembro deste ano? Ficariam vazios? Ou então os políticos atuais teriam o mandato estendido por alguns meses? Como vocês podem ver, é uma situação bem complexa, e, por isso, a decisão foi adiar sim as eleições, mas ainda para este ano.
Mas o problema não está completamente resolvido. Em dias de eleições geralmente são formadas filas enormes nas portas dos colégios eleitorais. Milhares de pessoas passam pelo mesmo lugar no mesmo dia e as aglomerações são comuns. Além disso, todo mundo precisa tocar na urna para votar e assinar o comprovante de votação. Ações que antes eram completamente normais e que hoje todo mundo evita fazer o tempo todo com medo de se contaminar. Mas então, qual seria a solução?
A gente sabe que não existe resposta certa, e também que esse não é um problema só do Brasil. Vários outros países que tiveram ou terão eleições esse ano passam pelas mesmas dúvidas e buscam alternativas. Os Estados Unidos, que tiveram votação este mês, tentaram o uso do voto pelo correio. Mas o modelo levantou muitas dúvidas sobre a possibilidade de fraude eleitoral.
Enquanto o Brasil adia as eleições municipais deste ano e os Estados Unidos lidam com a controvérsia sobre as urnas eletrônicas e as cédulas por correio, a Estônia possui desde 2005 um sistema de votação remota.
O sistema i-Voting da Estônia permite que os cidadãos votem em casa, em seus computadores, usando um cartão inteligente emitido pelo Governo. Atualmente, esse sistema é usado por 46,7% da população, um número que tem aumentado constantemente ao longo dos anos. A Estônia é a única nação do mundo a votar dessa maneira. E tem mais, todo o código do sistema é aberto para qualquer governo do mundo usar. O problema não é a tecnologia e sim a falta de confiança dos eleitores.
Para o sistema funcionar, as pessoas precisam se sentir seguras em passar ao governo sua identidade eletrônica e informações pessoais. E como contrapartida, o governo tem que ser muito transparente sobre o uso de dados dos seus cidadãos. O que faz o i-Voting é o e-ID, um cartão de identificação nacional com um chip que usa criptografia. Ele é usado por 99% dos cidadãos.
O e-ID serve como identificação definitiva em vários serviços do governo da Estônia. Pode ser usado como cartão de saúde nacional, para assinar documentos digitalmente, pagar impostos, acessar contas bancárias, abrir uma empresa e até para votar.
Para votar, o cidadão faz o download do aplicativo, que reconhece imediatamente o distrito de votação do usuário e exibe uma lista de escritórios e candidatos. Depois de escolher o seu candidato, a pessoa digita um código PIN que funciona como uma assinatura jurídica. Após a votação, ainda aparece um QR Code, que o eleitor pode escanear e conferir se o voto foi devidamente validado. E ainda é possível mudar de ideia. Durante o período de dez dias de votação, os eleitores podem voltar ao sistema e mudar seus votos quantas vezes quiserem antes do prazo final. Somente o último voto registrado é levado em consideração.
O sistema usado na Estônia também garante o sigilo, porque o voto é criptografado e só depois que acaba a eleição que ele é liberado para contagem. Outra promessa do i-Voting é a segurança contra fraudes. As cédulas digitais criptografadas só podem ser verificadas e alteradas pelo próprio eleitor, e os votos são visíveis apenas para os membros do Comitê Eleitoral Nacional da Estônia.
Se o i-Voting é tão conveniente e fácil, por que outros países não estão usando o sistema? Para garantir esse processo seguro e confiável de votação, a Estônia percorreu um longo caminho. Primeiro, para que as cédulas online sejam válidas, a legislação precisa considerar como válidas tanto assinaturas digitais quanto as físicas. Cada cidadão também tem que ter uma identidade digital única. E ainda precisa ter uma movimentação de dados muito segura, afinal, são as informações pessoas de milhões de pessoas que estão em jogo.
Todo esse caminho não é tão fácil e por isso poucos países aderiram ao i-Voting. Na Estônia, esses pré-requisitos necessários foram atendidos. Como resultado, durante as recentes eleições parlamentares, em 2019, mais de 46% de todos os eleitores votaram on-line. Quem sabe a gente chega lá.