JN insinua que caberá a Bolsonaro “desonra” histórica
Texto lido por William Bonner e Renata Vasconcellos critica os negacionistas da covid-19 e quem ataca a cobertura da imprensa
No dia em que o consórcio de imprensa contabilizou 1 milhão de brasileiros contaminados pelo novo coronavírus e 50 mil mortos pela covid-19, o Jornal Nacional teve abertura atípica, com longa dissertação feita por seus âncoras. Um editorial com forte teor emocional ressaltou a dor pela perda em série e em tão pouco tempo de tantas vidas.
“Uma nação se define como a reunião de pessoas que compartilham sentimentos. Afetos, laços, cultura, valores, uma história em comum. Empatia é a capacidade que o ser humano tem de se colocar no lugar do outro, entender o que o outro sente. Uma nação chora seus mortos, se solidariza com aqueles que perderam pessoas querida. Cinquenta mil (mortos). Diante de uma tragédia como essa, uma nação para, ao menos um instante, em respeito a tantas vidas perdidas. É o que o JN está fazendo agora diante desses rostos que nós temos perdido desde março”, disse Renata Vasconcellos.
“E é um sinal muito triste dos tempos que nós vivemos que a gente tenha que explicar essa atitude”, completou William Bonner. “Não para a imensa maioria do povo brasileiro, de jeito nenhum, mas para uma minoria muito pequena, mas muito barulhenta, para quem o que nós fazemos, o jornalismo profissional, deveria, senão fechar completamente os olhos para essa tragédia, pelo menos não falar dela com essa dor. O JN já pediu, você lembra, que a gente parasse para respirar porque tudo vai passar.”
Na sequência, o âncora e editor-chefe do telejornal mais assistido da televisão brasileira voltou a humanizar as estatísticas. “O JN já lembrou que as vidas perdidas não podem ser vistas só como números. A gente repete mais uma vez: respira, vai passar. A gente repete também: 50 mil não são um número, são pessoas que morreram numa pandemia. Elas tinham família. Mães, pais, filhos, irmãos, tios, avós. Famílias. Tinham amigos, conhecidos, vizinhos, colegas de trabalho como nós aqui somos. E nós, como nação, devemos um momento de conforto para todos eles.”
“E para nós mesmos, porque nós somos uma nação”, completou Renata. “Como o Bonner disse, tudo isso vai passar, e quando passar, é a História com H maiúsculo que vai contar para as gerações futuras o que de fato aconteceu. A História vai registrar o trabalho valoroso de todos aqueles que fizeram de tudo para combater a pandemia. Os profissionais de saúde em primeiro lugar.”
Bonner continuou. “Mas a História vai registrar também aqueles que se omitiram, os que foram negligentes, os que foram desrespeitosos. A História atribui glória e atribui desonra. E História fica para sempre”, disse, enfático. Foi, sem dúvida, uma indireta a um destinatário certo e conhecido: Jair Bolsonaro. O presidente tem sido criticado na imprensa em geral pela falta de declarações de solidariedade às vítimas e por sua postura negacionista em relação à letalidade da pandemia.
No final de abril, o JN chegou a exibir uma linha do tempo com as falas mais polêmicas de Bolsonaro a respeito do novo coronavírus. A cobertura da Globo o incomodou tanto que, após o Ministério da Saúde retardar o horário de divulgação dos dados sobre contaminados e mortos, o presidente soltou um deboche: “Acabou matéria no Jornal Nacional”. As reportagens continuam, noite após noite, agora com apuração independente de vários veículos de imprensa reunidos. No final da edição de sábado (20), o telão da redação do JN exibiu a tétrica contabilização do dia: 50.058 vidas perdidas.