Protestos deste domingo fortalecem a oposição ao governo Bolsonaro?

"A partir de hoje a polarização deixa de ser esquerda-direita e passa a ser entre os 70% e os 30% de apoio ao governo", diz o consultor Renato Meirelles

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Protestos tomaram as ruas de várias capitais brasileiras neste domingo, 7, em cidades como São Paulo, Rio de Janeiro, Brasília e Porto Alegre. Manifestações contra o governo do presidente Jair Bolsonaro e com pauta antirracista terminaram sendo maiores do que os atos pró-governo na maior parte das cidades que registraram protestos.

Em São Paulo, que registrou o maior ato de oposição, mais de 3.000 pessoas se manifestaram no Largo da Batata. Atos menores a favor do governo foram registrados em cidades como o Rio de Janeiro e Brasília.

Ainda assim, para o consultor Renato Meirelles, do Instituto Locomotiva, de pesquisas, a oposição real ao governo é ainda maior do que as manifestações mostraram. Isso porque, entre a oposição, há uma maior resistência a sair às ruas em meio à pandemia do novo coronavírus, que já fez mais de 35.000 vítimas fatais no Brasil — o país é hoje o terceiro com mais mortes no mundo, superando a Itália nesta semana.

Fora do Brasil, o domingo também foi marcado por manifestações com milhares de pessoas nos Estados Unidos, que seguiram para o 13º dia de protestos após a morte do jovem negro George Floyd por um policial. Também ocorreram grandes manifestações em diversos países europeus, como Bélgica e Reino Unido, que foram impactados pelos atos americanos e fizeram protestos antirracistas neste fim de semana.

Apesar de terem mais pessoas nas ruas, Meirelles não acredita que as manifestações no exterior são necessariamente maiores ou mais fortes do que no Brasil. “Está claro que as manifestações de hoje contra o governo seriam muito maiores se não fosse a pandemia. Manifestar durante a pandemia é algo que está dividindo esse campo oposicionista”, diz.

Na sexta-feira, 5, o rapper Emicida foi um dos que se manifestou nas redes sociais contra as manifestações de oposição, diante da contaminação pelo coronavírus e pelo temor de que houvesse uma escalada da violência policial contra os manifestantes.

Fora da base fiel de apoio ao governo, na casa de 30%, Meirelles aponta que há uma oposição de 70% dos brasileiros que hoje discorda do governo. O analista afirma que, nesta parcela, está não somente a esquerda mas grupos diversos. Bolsonaro vem sendo criticado por suas medidas em meio à pandemia, ao comparecer a protestos de seus apoiadores, incentivar aglomerações, negar conselhos médicos e entrar em embate com instituições como o Congresso e o Supremo Tribunal Federal.

“A partir de hoje a polarização deixa de ser esquerda direita e passar a ser entre os 70% e os 30% de apoio ao governo. É um novo marco nessa polarização, que separa o campo dito democrático de um campo que vem se portando mais como negacionista”, diz Meirelles. “É um movimento que já vinha existindo nas redes sociais e marca um desgaste do governo, ainda que com menos gente na rua do que seria sem pandemia.”

Meirelles faz um paralelo histórico com os movimentos de anistia após a Ditadura Militar e as Diretas Já, que uniram campos diversos pelo mesmo movimento — de Tancredo Neves a Luiz Inácio Lula da Silva. “Do ponto de vista da opinião pública, essa frente ampla é a mesma coisa. Não significa aliança eleitoral, de forma alguma. Apenas um campo civilizatório que, neste momento, se posiciona contra um retrocesso maior”, diz.

Sobre um potencial impeachment do presidente Jair Bolsonaro, Meirelles acredita que é “impossível” que o presidente deixe o cargo com os 30% de popularidade que possui atualmente, e que não vê este patamar caindo por ora. “A oposição acredita que Bolsonaro vai cair dos 30% para 25% ou 20% [de popularidade], o que não acredito que vá acontecer”.

Para Meirelles, a segregação dentro do campo dos 70% restantes foi o que levou Jair Bolsonaro a vencer as eleições de 2018. “Hoje os bolsonaristas pregam para os 30% convertidos e esquecem que é no restante das pessoas que está a saída. Foi o que levou a esquerda à derrota em 2018”, diz.

As manifestações não foram só de oposição ao governo, mas também tiveram a pauta antirracista. Cartazes como “O racismo é a doença que mais mata” e “Vidas negras importam” foram usados nas manifestações. No Brasil, as pautas antirracistas ganharam motivação de casos locais, como a morte de jovens negros nas periferias.

Entre os casos citados pelos manifestantes estão o do menino Miguel, de 5 anos, que morreu ao cair do nono andar de um prédio em Recife por suposta negligência da patroa da mãe do garoto, e de João Pedro, de 14, morto pela polícia em sua casa. As mortes da vereadora Marielle Franco e o motorista Anderson Gomes, mortos em uma emboscada em 2018, também foram lembradas.

“Claro que esses protestos acabaram associados a um tema maior aqui, o do fortalecimento da democracia, e as coisas se juntaram nesse momento”, diz Paulo Rogério Nunes, consultor e representante do movimento negro no empreendedorismo, cuja coluna aparece nesta edição quinzenal da revista EXAME. “Os protestos foram bem-sucedidos, mesmo com as dificuldades do momento, as pessoas foram para as ruas e colocaram suas demandas. O debate vai continuar nas redes sociais e na mídia.”

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Fonte exame
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