Brasil já sente impactos das mudanças climáticas e situação pode se agravar

Eventos extremos, como os temporais que atingem a região Sudeste, serão cada vez mais comuns caso a temperatura global continue a aumentar. Cientistas também alertam para ameaças à saúde pública, elevação do nível do mar e savanização da Amazônia.

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Desde o final de janeiro, o Sudeste brasileiro sofre com sucessivas chuvas torrenciais. No estado de São Paulo, as pancadas iniciaram na tarde do último domingo, 9 de fevereiro, e se estenderam pela madrugada. Em um dia, o volume foi suficiente para transbordar os dois principais rios da capital paulista, o Tietê e o Pinheiros. Em apenas 24 horas, o volume de chuvas na capital paulista foi de 92,4mm – o equivalente a 42,6% dos 216,7mm da média para fevereiro. Até às 7 da manhã desta terça-feira, já choveu 215,5mm, ou 99,4% do esperado para o mês. As informações são do Centro de Gerenciamento de Emergências Climáticas (CGE), da Prefeitura de São Paulo.

Ao longo de segunda, o Corpo de Bombeiros recebeu 10.371 ligações, que resultaram em 2.345 ocorrências relacionadas a enchentes, desabamentos, deslizamentos e quedas de árvores. A Defesa Civil paulista confirmou sete mortes, 1528 desalojados e 408 desabrigados, em balanço divulgado na manhã desta terça. Já a Companhia de Entrepostos e Armazéns Gerais de São Paulo (Ceagesp), o terceiro maior centro atacadista do mundo, ficou abaixo d’água teve prejuízo estimado em R$ 21 milhões.

Em Minas Gerais, mais de 100 cidades ficaram em estado de alerta. Só na capital Belo Horizonte choveu 935,2 milímetros em janeiro, recorde histórico para o mês segundo o Instituto Nacional de Meteorologia (Inmet) e mais da metade da média anual. Os danos socioeconômicos dão o tom da gravidade do ocorrido no estado mineiro: 59 mortes ligadas às tempestades, mais de 45 mil pessoas desalojadas e 8 mil desabrigadas, de acordo com a Defesa Civil estadual.

O município de Alfredo Chaves foi um dos mais atingidos pelas tempestades que assolaram o estado do Espírito Santo no início deste ano. Em todo o estado, dez pessoas morreram, 14.098 ficaram desalojadas e 1.280 desabrigadas, segundo a Defesa Civil.
FOTO DE GOVERNO DO ESPÍRITO SANTO

As fortes chuvas, que também se instauraram no Espírito Santo e no Rio de Janeiro, chamam a atenção para a variabilidade do ciclo hidrológico – um dos reflexos mais preocupantes do aquecimento global no Brasil. Esta mudança é representada pela maior frequência de eventos climáticos extremos: as estiagens são mais duradouras e intensas, assim como as épocas chuvosas.

“No Brasil, a alteração do ciclo hidrológico já está acontecendo agora. Não é uma coisa para 2100”, observa Paulo Nobre, coordenador do Modelo Brasileiro de Sistema Terrestre (BESM), do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe).O cientista considera uma irresponsabilidade tratar esses fenômenos extremos, a exemplo das chuvas intensas no Sudeste, como se fossem eventos episódicos que só acontecem uma vez a cada cem anos.

Se as emissões de gases de efeito estufa e, por consequência, a temperatura média global continuarem em alta, “as regiões Norte e Nordeste e parte do Centro-Oeste sofrerão uma redução nas chuvas, com períodos de estiagens predominantemente mais longos, mas talvez sem a compensação de chover mais no período chuvoso”, projeta Nobre. “No Sul e no Sudeste, a tendência dos biomas ali representados é que também ocorram secas mais extremas e duradouras, intercaladas por períodos muito chuvosos.”

Rios subterrâneos na cidade de Belo Horizonte transbordaram, inundando a cidade. As tempestades deste início de ano que atingiram os estado de Minas Gerais deixaram 59 pessoas mortas, 45 mil desalojadas e 8 mil desabrigadas, de acordo com a Defesa Civil.
FOTO DE PREFEITURA DE BELO HORIZONTE

Nobre atualmente investiga as mudanças mais próximas que acontecerão em decorrência da emergência climática no Brasil. O estudo deve ser publicado no início deste ano. “Como nossos modelos subestimam a taxa de crescimento da variação do clima”, avalia o cientista, “se olhar as projeções para o final do período desse século, você terá uma apreciação mais precisa das variações da próxima década”. As secas sem precedentes na Amazônia em 2005 e 2010, intercaladas por uma grande enchente em 2009, e a estiagem no Sudeste de 2015 e 2016 demonstram “casos pilotos dessa variabilidade”.

A resposta à emergência climática

Em novembro de 2020, representantes dos 195 países signatários do Acordo de Paris estarão novamente reunidos em Glasgow, no Reino Unido, para a Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas. Entre os objetivos principais COP-26 está a readequação das metas nacionalmente determinadas (NDCs).

As ações precisam ser mais ambiciosas para manter o aumento da temperatura abaixo de 2°C comparado aos níveis pré-industriais (1850-1900) e, de preferência, limitá-lo em 1,5°C. Para isso, o Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC) concluiu, em um relatório especial de 2018, que os governos precisam alcançar neutralidade nas emissões de dióxido de carbono até 2050 e de todos os gases de efeito estufa (GEE) até 2070.

Climate Action Tracker (CAT) projeta uma elevação em 2,8°C até 2100 caso todas as metas atuais sejam cumpridas, conforme análise publicada em dezembro de 2019. Contudo, diante das crescentes emissões de GEE, o consórcio estima que o planeta caminha para um aumento de 3,2°C.

“O custo das mudanças climáticas está se tornando muito alto”, avalia Carlos Rittl, secretário-executivo do Observatório do Clima. “Em 2019, o Fórum Econômico Mundial, em Davos, ao elencar os principais riscos globais colocou a ausência de ação climática, ou a ação menor do que a necessária, e os eventos extremos, além de outros relacionados, como degradação de ecossistemas e questões ligadas a água.”

Rittl considera que a pressão dos ativistas jovens, que movimentam greves semanais pelo clima no mundo inteiro, tem obtido reações dos tomadores de decisão. Em novembro passado, o Parlamento Europeu declarou a emergência climática. Noruega, Nova Zelândia e Alemanha adotaram objetivos para zerar suas emissões de GEE até 2050 e a África do Sul deve reduzir as suas pela primeira vez.

Quando se trata do enfraquecimento das ações climáticas, o relatório do CAT destaca o Brasil, onde há uma “contínua inversão das políticas ambientais”. O consórcio enfatiza a alta no desmatamento da Amazônia que já se estende por uma década, diante de alterações para abrandar leis, cortes de orçamento e desestruturação dos órgãos de fiscalização e combate ao desmatamento.

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Fonte nationalgeographicbrasil
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